quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

FC Porto resolveu bem o caso Quaresma?

O incómodo de Ricardo Quaresma após os assobios de que foi alvo no jogo com o Desp. Aves era evidente. A sua vontade de sair ficou sub-entendida quando disse que “a época está quase a acabar e depois já não terão que assobiar mais”. À possibilidade de nascimento de um caso, o FC Porto respondeu prontamente com a renovação do contrato com o jogador até 2011 e o anúncio do resgate do remanescente do passe que ainda estava nas mão do First Portuguese. Morre aqui o caso-Quaresma ou esta foi apenas uma operação que o submerge e o deixa à espera de nova ocasião para reaparecer?

TESE
Veio transformar
assobios em aplausos
Os constantes assobios dos adeptos do FC Porto a Quaresma afectavam um jogador que é dos mais valiosos da equipa, dos que mais contribuiu para os últimos dois títulos – e para a caminhada vitoriosa desta época – e dos que mais euros pode valer numa futura operação de mercado, a fazer com um dos muitos grandes clubes europeus que nele estão interessados. Ao criarem uma situação incómoda a Quaresma, os adeptos estavam a prejudicar o clube em vários aspectos, do desportivo ao financeiro, pelo que este respondeu como devia: colocou-se ao lado do jogador.
É certo que a renovação já estava apalavrada há algum tempo e que a extinção da parceria com o First Portuguese era apenas uma questão de oportunidade – o Sporting também já o fizera, trocando percentagem no passe de jogadores por acções da SAD. Mas a escolha do momento para o anúncio é definidora e serve para dar um sinal de que na Torre das Antas não se toleram acções que possam diminuir o rendimento dos jogadores no campo e dos seus passes no defeso. O que o FC Porto quis dizer com o acto foi que não vale a pena continuarem a assobiar Quaresma, porque ele tem o respaldo da administração nas suas fintas. O preço a pagar pelo jogador foram declarações de amor que, mesmo que possam ser ultrapassadas por uma oferta melhor, levarão a que ele seja ovacionado quando voltar a ser anunciado pelo “speaker” do Dragão.
Aliás, com esta renovação, o FC Porto ainda aumentou a potencial maquia a receber quando Quaresma quiser mesmo sair, pois já se sabe que os valores das transferências crescem com o tempo que falta cumprir num contrato: com a liberdade mais distante – a três anos e meio de distância – quem quiser Quaresma vai mesmo precisar de se chegar à frente com uma mala cheia de notas.

ANTÍTESE
Operação soluciona
apenas mediatização

Quaresma já jogou no Barcelona e ninguém lhe leva a mal o desejo de voltar a uma das grandes Ligas europeias, seja em Espanha, em Itália ou em Inglaterra. Em Portugal, não tem rival na arte e na influência, mas continua a ser incompreendido pelos adeptos do seu próprio clube e, ao mesmo tempo, a ver fugir por somas alucinantes jogadores que não são tão fortes ou inspiram tantos títulos como ele. A reacção no final do jogo com o Desp. Avez teve a ver com o acumular de tensões relacionadas com estas duas situações: Quaresma sentir-se-ia simultaneamente mal-amado e mal-pago. E não é uma renovação de contrato que vai resolver-lhe o problema.
Embora com este caso tenha criado um perigoso precedente – a partir de agora, jogador que queira um novo contrato só tem que insinuar frente às câmaras de televisão que pode estar de saída – a renovação foi uma jogada de mestre, isso sim, mas do ponto de vista mediático. Com aquilo que ela significa, os adeptos passarão a sentir que, ao assobiarem o jogador, estão ao mesmo tempo a assobiar a administração e o presidente que decidiu renovar-lhe o contrato quando ele era apupado e, por meias palavras, falava em saída. Com este acto, resolve-se, à partida, a contestação das bancadas. Mas o que levou Quaresma a desabafar não foi só isso e, mesmo com ligação até 2011, o FC Porto corre o risco de, a cada vez que se fale na transferência para um clube dos grandes mercados, o jogador voltar a sentir mal-estar e a pensar na saída ou nas férias.
Por isso, a não ser que uma das contrapartidas apresentadas ao jogador para renovar tenha sido o compromisso de o deixar sair a partir de determinados valores, ele continuará a viver amargurado com a prisão na pouco influente Liga portuguesa.

SÍNTESE
O FC Porto resolveu o caso-Quaresma como pôde. A administração fez o que tinha a fazer: apoiou o jogador, criou condições para que voltasse a sentir-se bem no relvado e valorizou-o na perspectiva de uma futura saída. Mas acreditar que a renovação de contrato resolveu de vez o problema de um jogador que, mesmo sendo bi-campeão é ainda muitas vezes visto como exterior à cultura do clube e que também ele sonha voltar pisar os palcos dos maiores campeonatos da Europa, é ser ingénuo ou mais papista do que o Papa.
Publicado em O Jogo, 24/01/2008

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