O futebol português são, cada vez mais, dois futebóis: o dos remediados e o dos que não têm remédio. Numa altura em que FC Porto, Sporting e Benfica vivem à sombra dos resultados positivos que anunciaram para o último exercício, a Liga anunciou a Sagres como novo parceiro institucional. A conjuntura devia ser de euforia, mas não é. Os jogadores do Estrela da Amadora não se treinam porque não recebem salários há dois meses. O Boavista continua a enfrentar penhoras por causa de dívidas a ex-atletas. O V. Setúbal perde de uma vez, com o regresso de Matheus a Braga e a venda de Edinho ao AEK, 18 dos seus golos, arriscando-se a ver fugir mais uns quantos se Pitbull recuar na decisão de acreditar num projecto que, sem as outras referências atacantes, está condenado a começar a perder gás. A globalidade do futebol nacional tem a corda na garganta e só passará a viver dias mais tranquilos quando houver a coragem de questionar tudo o que diz respeito à sua organização. A verdade é que o futebol português precisa urgentemente de um Ctrl+Alt+Del. De um “reset” que lhe permita reiniciar o sistema.
Como estão as coisas, o grandes do futebol nacional perdem as estrelas para os grandes clubes europeus, nessas transacções fundando os tais resultados positivos, e vão substituí-las por soluções de baixo custo – mas rentabilidade arriscada – em mercados ainda mais alternativos do que o nosso. Não recorrem aos jogadores de classe média da nossa Liga, porque, sendo melhores, esses são também mais caros e menos apetecíveis para o mercado global do que as tais potenciais estrelas estrangeiras, e porque não estão dispostos a pagar tanto por eles como os Limassois ou os Clujs dessa Europa. Como esses jogadores de classe média também estão fartos de jogar em equipas que deviam ser de classe média como eles mas têm hábitos pagadores muito irregulares, optam mesmo pela emigração para campeonatos de terceira linha, onde ganham mais e a horas certas. E, depois de já ter perdido as estrelas para Inglaterra ou Espanha, Portugal perde também os jogadores medianos. Restam os fracos e os adolescentes estrangeiros, comprados a pensar num negócio mirabolante de exportação.
O problema é que nenhum negócio vive da exportação se não for saudável internamente. E até os patrocinadores começarão a fugir se o problema de raiz não se resolver. Se a Liga continuar a fazer jogos para mil pessoas. Se, além de os venderem no defeso, os clubes tiverem que continuar a desfazer-se dos seus melhores jogadores a meio das épocas, como fez agora o Nacional com Benaglio e pode fazer o Marítimo com Makukula. O futebol português não pode estar dependente do nascimento de uma estrela em Alcochete ou no Olival – a sua saúde tem que ser consolidada em receitas correntes. E os muitos anos de crise já deviam ter-nos ensinado que isso só se conseguirá no momento em que houver coragem política de colocar tudo em causa. No momento em que a Liga passar a ser muito mais exigente com os clubes que aceita nas suas competições, não só do ponto de vista da demonstração do cumprimento de compromissos financeiros passados mas também de prova de viabilidade do projecto e de apelo junto do público da sua região. No momento em que houver força para impor aos três grandes a necessidade de uma partilha mais democrática dos dinheiros da televisão, de forma a que os outros clubes não definhem e a competição ganhe com isso. No momento em que Liga e Federação consigam por fim desenhar um quadro competitivo que sirva os verdadeiros interesses do futebol nacional. A saber: sem jogos que acabem às 23 horas em véspera de dia de trabalho, com competições que cheguem a todo o país e não apenas ao litoral entre Braga e Setúbal, e com o necessário enquadramento para os sub-20 que ainda não têm lugar nos plantéis principais mas precisam de crescer competitivamente.
Por muito que queiram convencer-vos disso, o problema do futebol português neste momento já não é de credibilidade ou de suspeitas de corrupção. É de incapacidade para deitar fora um modelo que não serve e desenhar um completamente novo.
Como estão as coisas, o grandes do futebol nacional perdem as estrelas para os grandes clubes europeus, nessas transacções fundando os tais resultados positivos, e vão substituí-las por soluções de baixo custo – mas rentabilidade arriscada – em mercados ainda mais alternativos do que o nosso. Não recorrem aos jogadores de classe média da nossa Liga, porque, sendo melhores, esses são também mais caros e menos apetecíveis para o mercado global do que as tais potenciais estrelas estrangeiras, e porque não estão dispostos a pagar tanto por eles como os Limassois ou os Clujs dessa Europa. Como esses jogadores de classe média também estão fartos de jogar em equipas que deviam ser de classe média como eles mas têm hábitos pagadores muito irregulares, optam mesmo pela emigração para campeonatos de terceira linha, onde ganham mais e a horas certas. E, depois de já ter perdido as estrelas para Inglaterra ou Espanha, Portugal perde também os jogadores medianos. Restam os fracos e os adolescentes estrangeiros, comprados a pensar num negócio mirabolante de exportação.
O problema é que nenhum negócio vive da exportação se não for saudável internamente. E até os patrocinadores começarão a fugir se o problema de raiz não se resolver. Se a Liga continuar a fazer jogos para mil pessoas. Se, além de os venderem no defeso, os clubes tiverem que continuar a desfazer-se dos seus melhores jogadores a meio das épocas, como fez agora o Nacional com Benaglio e pode fazer o Marítimo com Makukula. O futebol português não pode estar dependente do nascimento de uma estrela em Alcochete ou no Olival – a sua saúde tem que ser consolidada em receitas correntes. E os muitos anos de crise já deviam ter-nos ensinado que isso só se conseguirá no momento em que houver coragem política de colocar tudo em causa. No momento em que a Liga passar a ser muito mais exigente com os clubes que aceita nas suas competições, não só do ponto de vista da demonstração do cumprimento de compromissos financeiros passados mas também de prova de viabilidade do projecto e de apelo junto do público da sua região. No momento em que houver força para impor aos três grandes a necessidade de uma partilha mais democrática dos dinheiros da televisão, de forma a que os outros clubes não definhem e a competição ganhe com isso. No momento em que Liga e Federação consigam por fim desenhar um quadro competitivo que sirva os verdadeiros interesses do futebol nacional. A saber: sem jogos que acabem às 23 horas em véspera de dia de trabalho, com competições que cheguem a todo o país e não apenas ao litoral entre Braga e Setúbal, e com o necessário enquadramento para os sub-20 que ainda não têm lugar nos plantéis principais mas precisam de crescer competitivamente.
Por muito que queiram convencer-vos disso, o problema do futebol português neste momento já não é de credibilidade ou de suspeitas de corrupção. É de incapacidade para deitar fora um modelo que não serve e desenhar um completamente novo.
Publicado em Diário de Notícias, 26/01/2008
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