Não é preciso nenhum tratado de astrofísica para perceber que o plantel do FC Porto é o mais rico dos dos três clubes grandes em Portugal. Contudo, se olharmos apenas para os resultados, é no Dragão que mais se fazem sentir as ausências dos jogadores nucleares: nas duas vezes que alinhou sem Pepe, por exemplo, o FC Porto perdeu, como perdeu no único jogo que Jesualdo Ferreira fez sem Helton ou Lucho Gonzalez (este faltou também na Supertaça, mas aí a equipa estava entregue a Rui Barros).
É uma questão de peso específico: por terem mais qualidade, há jogadores que deixam a equipa órfã quando não podem dar-lhe o seu contributo. E aqui fala-se sobretudo de Pepe, mas também de Lucho ou Quaresma. “O Pepe é o jogador mais difícil de substituir no FC Porto. E ninguém se lembra, por exemplo, do Pedro Emanuel”, diz Toni, ex-treinador e jogador do Benfica. “Faz mais falta o Pepe que o Quaresma, porque é mais constante”, complementa, enquanto António Sousa, ex-futebolista do FC Porto, garante que as opções de qualidade ao dispor de Jesualdo Ferreira são tantas que não permitem que no grupo surjam insubstituíveis. “Esta equipa está colectivamente preparada para não ter insubstituíveis”, diz.
Na verdade, um só homem marcou presença nos 30 jogos que o FC Porto fez esta época: Lisandro Lopez. O argentino não foi sempre titular (saiu nove vezes do banco) e raramente completou um jogo de princípio a fim, o que leva a que seja apenas o oitavo em total de minutos, mas jogou sempre. Algo que pode ver ameaçado em breve, pois já acumulou quatro cartões amarelos e está a apenas um da suspensão. Helton, Lucho Gonzalez, Pepe, Bruno Alves e Quaresma são os outros elementos de quem menos vezes Jesualdo Ferreira abdicou, nalguns casos com resultados caóticos, como a eliminatória da Taça contra o Atlético, onde do sexteto só jogaram Quaresma e Lisandro (este entrou ao intervalo).
Mesmo assim, a maior qualidade do plantel do FC Porto não oferece dúvidas. “Tem excelentes opções, especialmente para o lugar de avançado, que é aquele em que eu reparo mais”, diz o maritimista Lipatin, um dos melhores marcadores da Liga em jogos nos quais saiu do banco, com três golos na condição de suplente utilizado. “Tem o Adriano, o Postiga, o Bruno Moraes e até o Rentería, que não jogou muito, mas que eu conheço bem”, completa. Toni concorda: “salta à vista que é o FC Porto quem tem mais soluções. E para os diversos sectores”. Sobretudo porque, no entender do homem que tão bem conhece o Estádio da Luz, “no Benfica há 14 ou 15 jogadores de grande qualidade, mas depois falta cobertura em algumas posições. Por isso é que, sem o Luisão, o Fernando Santos não usou o David Luiz e fez recuar o Katsouranis, comprometendo o meio-campo”.
Ora o Benfica até é a equipa com mais jogos nas pernas esta época (33, antes do desafio de anteontem, com o PSG) e, de todos os elementos do plantel, só dois alinharam sempre: o guarda-redes Quim e o médio Katsouranis, o que reflecte bem a importância dos dois no equilíbrio da equipa. Algo que pode alargar-se a Simão, que faltou apenas aos primeiros três jogos da época (os dois com o Áustria e a estreia desastrosa na Liga, com o Boavista). “O Simão, sendo um jogador de ataque, impõe-se pela constância do seu rendimento”, diz Toni que, tal como Sousa, aponta o capitão como o jogador mais difícil de substituir no Benfica: “É a mais-valia do plantel. Se ele joga menos, o Benfica ressente-se logo”, diz Sousa.
Ora Simão e Katsouranis também somam já quatro amarelos, pelo que em breve Fernando Santos pode ver-se na contingência de ter de os substituir. Uma dor de cabeça, tal como deverá ser para Paulo Bento o dia em que ficar sem Moutinho, o único jogador do Sporting presente nos 30 jogos que a equipa fez esta época e também ele com quatro amarelos no cadastro. De qualquer modo, para já, Paulo Bento tem de preocupar-se com a falta que vai fazer-lhe Liedson nos jogos com o E. Amadora e o FC Porto, depois de ter sido expulso em Leiria. É que, embora o “Levezinho” só tenha ficado de fora uma vez esta época, tal sucedeu no jogo onde se definiu a sorte do Sporting na Liga dos Campeões: a derrota em Milão, com o Inter. E no Dragão pode resolver-se também a Liga.
FC PORTO
E ainda há terceiras
Se olharmos para o plantel do FC Porto, verificamos que os 25 jogadores já utilizados apresentam não apenas segundas como até terceiras linhas de qualidade inquestionável. Helton tem como sombra o internacional Baía, mas também o titular das “esperanças”, Paulo Ribeiro. Depois, na defesa, há quatro laterais fortes (Bosingwa, Fucile, Cech e Mareque) e talvez a maior carência sejam os duplos dos centrais (Pepe e Bruno Alves), pois só restam João Paulo e Ricardo Costa. A meio-campo, entre os menos utilizados ainda surgem Anderson, Ibson ou Jorginho. Mas é no ataque que a fartura chega a incomodar: se partirmos do princípio que Quaresma, Lisandro e Postiga conquistaram a vaga de titulares, sobra um segundo ataque, com Vieirinha, Adriano e Alan, mais Sokota, Bruno Moraes e Rentería. E Diogo Valente e Sektioui até já foram embora.
BENFICA
Jogadores sem suplente
O plantel do Benfica ombreia com o do FC Porto na formação do onze, mas falta-lhe profundidade. É verdade que nele há duas excelentes alternativas a Quim (Moreira e Moretto, ambos sem um único minuto de jogo esta época), mas depois se falta alguém do quarteto defensivo será um problema. Tal como não confiou no terceiro central (David Luiz) nas Aves, recuando Katsouranis do meio-campo para substituir Luisão, não se sabe o que faria Santos se ficasse sem Nelson (nas suas ausências jogou o já transferido Alcides). Leo tem em Miguelito uma alternativa credível, mas o mesmo já não pode dizer-se do meio-campo, onde, com Nuno Assis suspenso, além dos quatro titulares e de Rui Costa, apenas sobram Paulo Jorge, Beto e João Coimbra. Na frente, as coisas nem estão mal, pois além de Nuno Gomes e Miccoli ainda há Mantorras e Derlei. E Manu e Marco Ferreira para qualquer eventualidade.
SPORTING
Rotatividade facilitou
O Sporting tem jogadores nucleares que, ou nunca faltaram, como Moutinho, ou viram a equipa perder nas suas ausências, como Liedson, que tem em Alecsandro e Bueno dois complementos. Mas a ideia que fica é que, além deles, pouco se nota se joga A ou B: são quase todos miúdos sem grandes oscilações e a quem a rotatividade facilitou a integração. Ter Ricardo não é o mesmo que ter Tiago, mas a equipa nunca perdeu sem o guarda-redes da selecção. Depois, sempre que falta um central, joga Veloso, sem perda de qualidade; e sempre que a baixa é nas laterais, a equipa serve-se da capacidade de Caneira para ocupar as duas faixas e chama, entre Abel e Ronny, o que estiver melhor. Veloso aproveitou as lesões de Custódio para ser o médio-centro mais utilizado, sendo ainda sobra Paredes. E para os outros lugares, há em Pereirinha, Romagnoli, Alves, Farnerud ou Carlos Martins alternativas pouco distantes do valor dos titulares.
Reforços inesperados
No início, todos contavam com eles. Mas lesões graves tiraram Anderson e Rui Costa das opções habituais de Jesualdo Ferreira e Fernando Santos, fazendo com que na soma dos minutos e dos desafios jogados apareçam como segundas linhas. E seguramente que, assim que eles regressarem, os treinadores se apressarão a encontrar-lhes espaço. Rui Costa chegou a ter definido um lugar no vértice mais avançado do losango de meio-campo, mas o sucesso de Simão a partir dali para os seus raides pelas alas já o empurrou, na última vez que regressou ao onze, para a posição de médio esquerdo, onde deve voltar a roubar o lugar a Karagounis. Quanto a Anderson, são muitas as opções ao dispor de Jesualdo: pode sacrificar Paulo Assunção e fazer recuar Meireles, pode tirar o próprio Meireles ou até meter o jovem brasileiro no trio de ataque, com Quaresma e Lisandro. A ver, este mês.
ENTREVISTA
O uruguaio Lipatín forma com o seu compatriota Carlos Bueno a dupla com mais golos feitos depois de começar no banco de suplentes
“Gostava de ter a fome do Bueno”
– Fez os seus últimos três golos depois de começar no banco. Há algum segredo?
– O que me ajuda é condicionar-me àquilo que o treinador quer, é usar de uma forma positiva aquilo que ele me diz, sem criar obstáculos ou barreiras. Claro que todos os jogadores querem entrar de início, mas eu procuro não me aborrecer se isso não suceder.
- Mas encara os jogos da mesma forma, quer entre de início ou seja chamado já para os minutos finais?
- Repare que, como sou um atacante, se eu entro durante um jogo é sinal de que as coisas não estão a correr bem para o Marítimo. São geralmente casos em que precisamos de virar um resultado. E isso favorece-me, pois eu dependo da predisposição atacante dos meus colegas. Se entro de início é diferente, pois o jogo ainda não tem uma direcção definida.
- Nos inúmeros clubes por onde passou já vivera uma situação como esta?
- Já. No México, quando joguei no América, fiz cinco golos depois de sair do banco. E lembro-me de um clássico, contra o Guadalajara, em que entrei aos 82 minutos para o lugar do Zamorano e tive a felicidade de fazer um golo na primeira bola que toquei.
- Você já é mais brasileiro do que uruguaio…
- É. Fui para o Brasil com sete anos.
- Mas digo-lhe isto porque os dois suplentes mais goleadores da Liga são o Bueno e você. Dois uruguaios. É uma característica nacional?
- A garra é uma característica dos uruguaios e é uma virtude muito boa do Bueno. Não tem tido muita sorte, às vezes joga bem e não faz golos, mas dá sempre tudo, com chuva ou com sol. Estimula-me vê-lo jogar. Gostava de ter essa fome de bola que ele mostra.
Publicado em Correio da Manhã, 10/3/2007
quarta-feira, 14 de março de 2007
Justiça desportiva e suspeição
Há pouco mais de um ano, Liedson teve frio e resolveu treinar de calças de fato de treino, mesmo sabendo que Paulo Bento disso o proibia. Julgou-se mais importante que o grupo, colocou em causa a autoridade do treinador e este castigou-o: foi ao Dragão sem o seu melhor jogador e esteve muito perto de ganhar um jogo que acabou empatado. No último fim-de-semana, frustrado por ter sido derrubado por um adversário quando tentava ganhar a melhor posição para corresponder a um previsível cruzamento da esquerda, Liedson deu-lhe um safanão com a sola da bota nas costas e foi expulso. Arrisca falhar novo jogo no Dragão e abre um caso que vai devolver o clima geral de suspeição ao futebol português.
E esse clima justifica-se plenamente, sobretudo pela forma arcaica como é administrada a justiça desportiva. Eu sei o que se passou, porque vi várias repetições do lance, de ângulos variados, em velocidade normal e em “slow motion”. Os juízes que vão aplicar a pena, certamente, viram o mesmo que eu e que qualquer um dos leitores. Contudo, na altura de decidir, devem esquecer tudo o que sabem e viram e basear a decisão no que escreveu o árbitro que, por sinal, nem viu mas ouviu contar – ao seu auxiliar. E se isto em si já é ridículo – compreender-se-ia como forma derradeira de tentar salvar a arbitrariedade decisória da evolução inevitável que há-de vir, mas não mais do que isso – o que dizer então da forma como o castigo é aplicado? Um paraíso para os amantes das estéreis discussões semânticas.
Se o árbitro escrever que o prevaricador “pôs em causa a integridade física” do adversário, este leva um jogo de castigo. Se optar pela formulação “agrediu o adversário”, pois serão dois jogos. Se, finalmente, disser que ele foi culpado “de conduta violenta”, a pena sobe ao trio de partidas. Escrevo antes da reunião da Comissão Disciplinar, mas como Paulo Costa optou pela versão intermédia, à hora a que me lêem já devem estar os dois jogos atribuídos. Pois eu, que pelos vistos sei pouco de português e que das poucas vezes que entrei no mundo à parte que existe para lá das portas de um tribunal me sentia como se tivesse acabado de entrar numa fita do M. Hulot, achava que quem agride um adversário não só está a pôr-lhe em causa a integridade física como está a incorrer em conduta violenta. Por isso, não sou capaz de distinguir as três situações e só dou graças a Deus por não ter que formar a minha opinião seguindo o código disciplinar da Liga.
Para o fazer, uso o bom-senso. E, embora reconheça razão ao Sporting num ponto – no lance devia ter tido direito a uma grande penalidade –, se Liedson ficar de fora no Dragão está a fazer-se justiça. Porque de acordo com o bom-senso, é mais grave pontapear as costas de um adversário do que treinar de calças de fato-de-treino numa manhã fria de Alcochete. As pessoas é que acham que quem não come porque não quer não passa fome – está de dieta.
Publicado em Sábado, 8/3/2007
E esse clima justifica-se plenamente, sobretudo pela forma arcaica como é administrada a justiça desportiva. Eu sei o que se passou, porque vi várias repetições do lance, de ângulos variados, em velocidade normal e em “slow motion”. Os juízes que vão aplicar a pena, certamente, viram o mesmo que eu e que qualquer um dos leitores. Contudo, na altura de decidir, devem esquecer tudo o que sabem e viram e basear a decisão no que escreveu o árbitro que, por sinal, nem viu mas ouviu contar – ao seu auxiliar. E se isto em si já é ridículo – compreender-se-ia como forma derradeira de tentar salvar a arbitrariedade decisória da evolução inevitável que há-de vir, mas não mais do que isso – o que dizer então da forma como o castigo é aplicado? Um paraíso para os amantes das estéreis discussões semânticas.
Se o árbitro escrever que o prevaricador “pôs em causa a integridade física” do adversário, este leva um jogo de castigo. Se optar pela formulação “agrediu o adversário”, pois serão dois jogos. Se, finalmente, disser que ele foi culpado “de conduta violenta”, a pena sobe ao trio de partidas. Escrevo antes da reunião da Comissão Disciplinar, mas como Paulo Costa optou pela versão intermédia, à hora a que me lêem já devem estar os dois jogos atribuídos. Pois eu, que pelos vistos sei pouco de português e que das poucas vezes que entrei no mundo à parte que existe para lá das portas de um tribunal me sentia como se tivesse acabado de entrar numa fita do M. Hulot, achava que quem agride um adversário não só está a pôr-lhe em causa a integridade física como está a incorrer em conduta violenta. Por isso, não sou capaz de distinguir as três situações e só dou graças a Deus por não ter que formar a minha opinião seguindo o código disciplinar da Liga.
Para o fazer, uso o bom-senso. E, embora reconheça razão ao Sporting num ponto – no lance devia ter tido direito a uma grande penalidade –, se Liedson ficar de fora no Dragão está a fazer-se justiça. Porque de acordo com o bom-senso, é mais grave pontapear as costas de um adversário do que treinar de calças de fato-de-treino numa manhã fria de Alcochete. As pessoas é que acham que quem não come porque não quer não passa fome – está de dieta.
Publicado em Sábado, 8/3/2007
Liga tinge-se de vermelho
A clara ultrapassagem do Benfica ao Sporting na tabela da Liga tem a ver com a forma como as duas equipas se vêm portando disciplinarmente. Depois de um início de época atribulado, com quatro expulsões nos primeiros três jogos, nos quais somou apenas três pontos, o Benfica estancou a onda de indisciplina que ameaçava tomar conta da equipa e já é, nas contas do deve e do haver das expulsões, o candidato mais favorecido pelas inferioridades numéricas.
Importante terá sido a forma como tanto a direcção como equipa técnica se recusaram a desculpabilizar os jogadores indisciplinados: Leo foi alvo de críticas públicas depois de deixar a equipa reduzida a 10 homens em Paços de Ferreira. Mas a forma como, em Alvalade, por exemplo, se olhou para o lado no caso da expulsão de Liedson não explica tudo. Poupados aos cartões vermelhos nas primeiras dez jornadas – o único visou João Alves, já depois de ter acabado o Sporting-Paços de Ferreira – os leões deixaram-se afundar num turbilhão disciplinar nas dez que se seguiram, com quatro expulsões decisivas.
É que, além de serem, entre os três candidatos ao título, os que têm saldo mais negativo (têm mais 58 minutos em inferioridade do que em superioridade numérica), os jogadores do Sporting fizeram-se expulsar em jogos ainda por decidir: Carlos Martins a 23 minutos do fim da visita ao Belenenses, com 0-0 no marcador; Alecsandro a meia-hora do final do jogo com o Boavista no Bessa, com a equipa a ganhar 1-0 (Zé Manuel foi depois expulso); e Liedson a 69 minutos do final do desafio com a União, em Leiria, com o placar virgem. Em contrapartida, sempre que tiveram a sorte de ver adversários expulsos, nunca disso se aproveitaram, ou porque o jogo estava perto do fim, ou porque já ganhavam ou perdiam folgadamente. A história do Benfica, que tem mais 100 minutos em superioridade do que em inferioridade numérica, é exactamente a inversa. Três das suas quatro expulsões sucederam no mesmo jogo, a visita ao Bessa, e arrancaram quando a equipa já perdia. Mas as vitórias obtidas em casa com o Marítimo e o E. Amadora só se consumaram quando os adversários já estavam reduzidos a dez, por expulsões de Marcinho e Pedro Simões, respectivamente.
Estranho é o facto de, mesmo sendo dos três a equipa que mais faltas sofre (ver texto e quadro abaixo), o FC Porto só ter tido um adversário expulso em 20 jogos: foi Alcaraz, há mais de meio campeonato, num jogo que os pupilos de Jesualdo Ferreira já ganhavam. Daí que, tal como o Sporting, também o FC Porto apresente um saldo negativo de meia-hora entre tempo com jogadores a mais e a menos. E no dia em que ficou reduzido a dez (em Leiria, por vermelho a Quaresma), perdeu mesmo.
FC Porto
Minutos em superioridade numérica - 15
Minutos em inferioridade numérica - 45
Benfica
Minutos em superioridade numérica - 148
Minutos em inferioridade numérica - 48
Sporting
Minutos em superioridade numérica - 54
Minutos em inferioridade numérica - 112
FC Porto melhor em tudo
O FC Porto é o mais rematador dos três candidatos ao título, mas não deixa ficar a superioridade por aí: além de visarem mais vezes as balizas adversárias, os jogadores de Jesualdo Ferreira são igualmente os que melhor se defendem, concedendo ao opositor menos situações de finalização.
Em média, por jogo, o FC Porto remata 14,2 vezes e apenas permite ao adversário ameaçar Helton em 7,6 ocasiões. Daí que se percebam melhor as razões que levaram o FC Porto a marcar golos em 18 dos seus 20 jogos, ficando apenas duas vezes em branco (e seguidas, contra a U. Leiria e o E. Amadora). O Benfica não fez golos em três ocasiões (duas face ao Boavista, outra com a Naval) e o Sporting em cinco (Paços de Ferreira, Benfica, Belenenses, Aves e Leiria). Trata-se, sobretudo, de uma questão de eficácia, pois se os jogadores de Paulo Bento precisam de 8,8 remates para fazer um golo, os homens de Fernando Santos conseguem-no a cada 6,6 remates e os de Jesualdo Ferreira a cada 6,4.
Já do ponto de vista defensivo, o comportamento do Sporting é melhor que o do Benfica, pois apenas permite que os adversários chutem 8,4 vezes por jogo, contra as 9,4 autorizadas pelo Benfica. O FC Porto tem a melhor defesa, com apenas 10 golos sofridos e 12 balizas invioladas, enquanto que o Sporting, que tem o mesmo número de adversários deixados a zero, já encaixou 12 golos. O Benfica, com 14 golos sofridos, até manteve a baliza virgem por 11 vezes (sete nos últimos nove jogos), mas é penalizado pelas três vezes em que deixou o campo vergado à “chapa três” do adversário.
Publicado em Record, 7/3/2007
Importante terá sido a forma como tanto a direcção como equipa técnica se recusaram a desculpabilizar os jogadores indisciplinados: Leo foi alvo de críticas públicas depois de deixar a equipa reduzida a 10 homens em Paços de Ferreira. Mas a forma como, em Alvalade, por exemplo, se olhou para o lado no caso da expulsão de Liedson não explica tudo. Poupados aos cartões vermelhos nas primeiras dez jornadas – o único visou João Alves, já depois de ter acabado o Sporting-Paços de Ferreira – os leões deixaram-se afundar num turbilhão disciplinar nas dez que se seguiram, com quatro expulsões decisivas.
É que, além de serem, entre os três candidatos ao título, os que têm saldo mais negativo (têm mais 58 minutos em inferioridade do que em superioridade numérica), os jogadores do Sporting fizeram-se expulsar em jogos ainda por decidir: Carlos Martins a 23 minutos do fim da visita ao Belenenses, com 0-0 no marcador; Alecsandro a meia-hora do final do jogo com o Boavista no Bessa, com a equipa a ganhar 1-0 (Zé Manuel foi depois expulso); e Liedson a 69 minutos do final do desafio com a União, em Leiria, com o placar virgem. Em contrapartida, sempre que tiveram a sorte de ver adversários expulsos, nunca disso se aproveitaram, ou porque o jogo estava perto do fim, ou porque já ganhavam ou perdiam folgadamente. A história do Benfica, que tem mais 100 minutos em superioridade do que em inferioridade numérica, é exactamente a inversa. Três das suas quatro expulsões sucederam no mesmo jogo, a visita ao Bessa, e arrancaram quando a equipa já perdia. Mas as vitórias obtidas em casa com o Marítimo e o E. Amadora só se consumaram quando os adversários já estavam reduzidos a dez, por expulsões de Marcinho e Pedro Simões, respectivamente.
Estranho é o facto de, mesmo sendo dos três a equipa que mais faltas sofre (ver texto e quadro abaixo), o FC Porto só ter tido um adversário expulso em 20 jogos: foi Alcaraz, há mais de meio campeonato, num jogo que os pupilos de Jesualdo Ferreira já ganhavam. Daí que, tal como o Sporting, também o FC Porto apresente um saldo negativo de meia-hora entre tempo com jogadores a mais e a menos. E no dia em que ficou reduzido a dez (em Leiria, por vermelho a Quaresma), perdeu mesmo.
FC Porto
Minutos em superioridade numérica - 15
Minutos em inferioridade numérica - 45
Benfica
Minutos em superioridade numérica - 148
Minutos em inferioridade numérica - 48
Sporting
Minutos em superioridade numérica - 54
Minutos em inferioridade numérica - 112
FC Porto melhor em tudo
O FC Porto é o mais rematador dos três candidatos ao título, mas não deixa ficar a superioridade por aí: além de visarem mais vezes as balizas adversárias, os jogadores de Jesualdo Ferreira são igualmente os que melhor se defendem, concedendo ao opositor menos situações de finalização.
Em média, por jogo, o FC Porto remata 14,2 vezes e apenas permite ao adversário ameaçar Helton em 7,6 ocasiões. Daí que se percebam melhor as razões que levaram o FC Porto a marcar golos em 18 dos seus 20 jogos, ficando apenas duas vezes em branco (e seguidas, contra a U. Leiria e o E. Amadora). O Benfica não fez golos em três ocasiões (duas face ao Boavista, outra com a Naval) e o Sporting em cinco (Paços de Ferreira, Benfica, Belenenses, Aves e Leiria). Trata-se, sobretudo, de uma questão de eficácia, pois se os jogadores de Paulo Bento precisam de 8,8 remates para fazer um golo, os homens de Fernando Santos conseguem-no a cada 6,6 remates e os de Jesualdo Ferreira a cada 6,4.
Já do ponto de vista defensivo, o comportamento do Sporting é melhor que o do Benfica, pois apenas permite que os adversários chutem 8,4 vezes por jogo, contra as 9,4 autorizadas pelo Benfica. O FC Porto tem a melhor defesa, com apenas 10 golos sofridos e 12 balizas invioladas, enquanto que o Sporting, que tem o mesmo número de adversários deixados a zero, já encaixou 12 golos. O Benfica, com 14 golos sofridos, até manteve a baliza virgem por 11 vezes (sete nos últimos nove jogos), mas é penalizado pelas três vezes em que deixou o campo vergado à “chapa três” do adversário.
Publicado em Record, 7/3/2007
terça-feira, 6 de março de 2007
O amarelo a Rossato
O Sporting protestou o jogo de Leiria por duas razões: porque entende que Liedson foi mal expulso e porque acha que Paulo Costa se esqueceu de marcar um penalti no lance que acabou com o goleador a “escoicear” as costas de Rossato. À primeira vista, ambas as situações poderiam no máximo prefigurar erros de facto, insusceptíveis de dar ganho de causa aos leões. E se na primeira bem pode Soares Franco esforçar-se por explicar que Liedson estava a levantar-se “de costas para o adversário”, que todas as mentes imparciais vêem que o “Levezinho” lhe dá intencionalmente com os pitons nas costas, é o segundo que encerra o busílis da questão. Porque Paulo Costa mostrou um amarelo a Rossato e este, de facto, não fez nada depois de ser agredido por Liedson, mas embrulhou-se claramente com o adversário, que lhe tinha ganho a dianteira, antes de ambos caírem na relva. Neste caso, talvez haja matéria para análise – não pela gravidade da falta, mas porque aqui poderia entrar a monstruosa figura do “erro de direito”. A questão é que tudo vai ser decidido de acordo com o relatório do árbitro. Precisam de um desenho? Então é assim: se este disser “mostrei cartão amarelo a Rossato por ter derrubado Liedson quando ambos corriam na área mas esqueci-me de marcar a falta, vejam lá que nem sei o que me deu!”, o protesto é válido; se disser “mostrei cartão amarelo a Rosato porque ele entrou em campo sem pedir autorização”, o protesto vai para o cesto dos papéis. Valerá a pena continuar a discussão?
Publicado em Correio da Manhã, 6/3/2007
Publicado em Correio da Manhã, 6/3/2007
sábado, 3 de março de 2007
Pauleta - Marcas de insularidade
Pauleta vive em Paris há quatro anos, mas ainda se lhe sentem traços de insularidade, um misto de revolta e humildade facilmente confundível com resignação. Somados a revezes muitas vezes provocados por convicções fortes, que lhe afastam o medo do erro e o empurram para soluções sem retorno, estes dois traços de carácter marcaram a vida de Pauleta desde o dia em que se emancipou.
Esse dia foi 11 de Outubro de 2000. Depois de 18 jogos pela selecção, 14 dos quais como suplente, e de ter desperdiçado a hipótese de brilhar no Europeu’2000 com uma expulsão tonta na festa de qualificação, contra a Hungria (um amarelo por ter chutado a bola depois de o árbitro apitar; outro por fazer um golo com a mão), Pauleta teve direito a um piscar de olhos da fortuna. Uma gripe de João Pinto empurrou-o para a titularidade em Roterdão, contra a Holanda. Portugal ganhou por 2-0 e Pauleta fez um golo num momento de insanidade em que, com o inseparável amigo Figo sozinho frente à baliza e dois adversários pela frente, resolveu desviá-los com o olhar e chutar cruzado para as redes. “A minha primeira ideia era meter a bola no Figo, mas pensei que ele estava fora-de-jogo”, começou por se justificar, com humildade. “Até parece que estavam à espera que eu falhasse para me caírem em cima”, finalizou, com revolta. A coragem de assumir o lance, essa, tê-la-á herdado do pai, avançado do Marítimo de Ponta Delgada, de quem assumiu também o nome de guerra: Pauleta.
Aquele que tem sido, nos últimos anos, um dos maiores veículos de promoção internacional dos Açores – a sua forma peculiar de festejar os golos, de braços abertos, planando, é quase um cartaz turístico – experimentou o Benfica como juvenil. Não ficou, jogou nas camadas jovens do FC Porto, mas quando Inácio quis levá-lo para o Rio Ave, com Bino ou Rui Jorge, seus colegas de juniores, preferiu regressar aos Açores, para jogar no Santa Clara. “A minha ‘escola’ nos Açores foi quase igual à do continente: treinar em campos pelados, das 7 à 9 horas da noite, e levar a roupa para lavar em casa”, dizia, desprezando a importância de se mostrar num grande. Era jovem, tinha espaço para errar. Jogou ainda no Operário e no União Micaelense antes de brilhar no Estoril, ao lado de Cavaco, com quem formou uma dupla que fez furor na II Divisão de Honra. João Alves quis então levá-lo para o Belenenses, mas o negócio gorou-se por 200 mil euros e Pauleta acabou por ir com o mesmo treinador para Salamanca, sem nunca ter experimentado da I Divisão portuguesa. Dois anos depois já valia 1,1 milhões de euros, na passagem para o Corunha. Estava a começar uma ascensão que lhe permitiu superar Eusébio no total de golos pela selecção, ser duas vezes melhor marcador do campeonato francês e ganhar uma Liga espanhola e duas Taças de França.
No último Verão, teve a possibilidade de se transferir para o Lyon. Não foi e, em vez de estar seguro do título francês e a lutar para vencer a Liga dos Campeões, vê-se a braços com mais uma das crises que ciclicamente afectam o PSG. O problema é que o espaço para errar vai diminuindo com o aproximar do final da carreira.
Publicado em Correio da Manhã, 3/3/2007
Esse dia foi 11 de Outubro de 2000. Depois de 18 jogos pela selecção, 14 dos quais como suplente, e de ter desperdiçado a hipótese de brilhar no Europeu’2000 com uma expulsão tonta na festa de qualificação, contra a Hungria (um amarelo por ter chutado a bola depois de o árbitro apitar; outro por fazer um golo com a mão), Pauleta teve direito a um piscar de olhos da fortuna. Uma gripe de João Pinto empurrou-o para a titularidade em Roterdão, contra a Holanda. Portugal ganhou por 2-0 e Pauleta fez um golo num momento de insanidade em que, com o inseparável amigo Figo sozinho frente à baliza e dois adversários pela frente, resolveu desviá-los com o olhar e chutar cruzado para as redes. “A minha primeira ideia era meter a bola no Figo, mas pensei que ele estava fora-de-jogo”, começou por se justificar, com humildade. “Até parece que estavam à espera que eu falhasse para me caírem em cima”, finalizou, com revolta. A coragem de assumir o lance, essa, tê-la-á herdado do pai, avançado do Marítimo de Ponta Delgada, de quem assumiu também o nome de guerra: Pauleta.
Aquele que tem sido, nos últimos anos, um dos maiores veículos de promoção internacional dos Açores – a sua forma peculiar de festejar os golos, de braços abertos, planando, é quase um cartaz turístico – experimentou o Benfica como juvenil. Não ficou, jogou nas camadas jovens do FC Porto, mas quando Inácio quis levá-lo para o Rio Ave, com Bino ou Rui Jorge, seus colegas de juniores, preferiu regressar aos Açores, para jogar no Santa Clara. “A minha ‘escola’ nos Açores foi quase igual à do continente: treinar em campos pelados, das 7 à 9 horas da noite, e levar a roupa para lavar em casa”, dizia, desprezando a importância de se mostrar num grande. Era jovem, tinha espaço para errar. Jogou ainda no Operário e no União Micaelense antes de brilhar no Estoril, ao lado de Cavaco, com quem formou uma dupla que fez furor na II Divisão de Honra. João Alves quis então levá-lo para o Belenenses, mas o negócio gorou-se por 200 mil euros e Pauleta acabou por ir com o mesmo treinador para Salamanca, sem nunca ter experimentado da I Divisão portuguesa. Dois anos depois já valia 1,1 milhões de euros, na passagem para o Corunha. Estava a começar uma ascensão que lhe permitiu superar Eusébio no total de golos pela selecção, ser duas vezes melhor marcador do campeonato francês e ganhar uma Liga espanhola e duas Taças de França.
No último Verão, teve a possibilidade de se transferir para o Lyon. Não foi e, em vez de estar seguro do título francês e a lutar para vencer a Liga dos Campeões, vê-se a braços com mais uma das crises que ciclicamente afectam o PSG. O problema é que o espaço para errar vai diminuindo com o aproximar do final da carreira.
Publicado em Correio da Manhã, 3/3/2007
Competições europeias viram a Leste
FC Porto, Benfica e Sp. Braga jogam esta semana o seu futuro na Liga dos Campeões e na Taça UEFA e, ao mesmo tempo, lutarão para ajudar Portugal a segurar um lugar entre os seis primeiros do ranking da UEFA. A Roménia, que mais ameaçava tirar aos portugueses a terceira vaga na Liga dos Campeões de 2008/09 já ficou sem representantes, de forma que só um cataclismo levará Portugal a ser ultrapassado por Alemanha e Holanda. O objectivo parece, desta forma, atingido. Mas 2008/09 deverá mesmo ser o último ano em que Portugal inscreve três equipas na prova mais rica do futebol europeu. Responsável: Michel Platini, novo presidente da UEFA.
No final de Janeiro, Platini viu o seu programa para a presidência da UEFA ser aprovado por 27 das 52 federações votantes no congresso de Dussledorf. E no programa estava lá, bem clara, a promessa de universalidade. “Mantenhamos a Liga dos Campeões com o formato actual, mas reequilibremo-la em favor dos campeonatos nacionais. Instauremos assim um número máximo de três clubes directamente qualificados por país para permitir a participação a mais nações”. Lennart Johansson, o sueco sob cujo mandato nasceu a Liga dos Campeões e candidato derrotado nas eleições (teve 24 votos, uma vez que houve dois nulos) discordava e, nos dias que antecederam o escrutínio, matraqueou sem cessar na mesma tecla. “Não farei nenhuma mudança numa competição apreciada por jogadores e clubes e seguida por televisões do Mundo inteiro”, prometia Johansson, acenando ainda com os cinco mil milhões de euros de receitas geradas pela prova desde a sua criação, há 15 anos, e que tanto têm ajudado a enriquecer o futebol.
Assim que foi eleito, o novo presidente da UEFA teve de responder acerca deste ponto. Não revelou um plano concreto, ou pelo menos não foi além do que dissera antes. “Trata-se apenas do quarto classificado dos campeonatos mais poderosos. E somente em 2009. Nunca antes”, disse. Em suma, a partir de 2009/10 os três primeiros classificados do ranking UEFA (presentemente Espanha, Inglaterra e Itália, por esta ordem), deixarão de poder levar quatro equipas à Liga dos Campeões: se actualmente têm dois qualificados directamente e mais dois em pré-eliminatórias (que quase sempre se qualificam) passarão apenas a ter três apurados de forma directa e ninguém nas rondas preliminares. Desta forma se libertam três vagas na fase de grupos, que poderão ser disputadas de forma mais aberta por nações de outros países em rondas classificatórias sem os papões que impedem a tal universalidade. O que Platini não revelou ainda é se, como é previsível, este efeito universalista se alargará depois aos países colocados nos lugares imediatamente a seguir (França, Alemanha e Portugal), que actualmente têm a possibilidade de levar três equipas à Champions (duas de forma directa e uma através de uma eliminatória preliminar).
O voto nas eleições da UEFA é secreto, pelo que não se sabe quem votou no plano de regresso às origens de Platini, mas a reacção de satisfação dada na sala por Zbignew Boniek quando os resultados foram anunciados deve-se seguramente a mais do que uma relação pessoal amigável com o seu ex-colega da Juventus. É que Platini usou uma táctica digna de Blatter, rodeando-se de pobres e excluídos (que são muitos) e seguramente garantindo desde logo os seus votos. E o que são neste momento os países de Leste no grande mapa do futebol europeu senão pobres e excluídos? Nos oito anos em que usou o sistema actual, com 32 equipas na fase de grupos (um total de 256 vagas, portanto), a Liga dos Campeões só teve a jogá-la 12 equipas do antigo bloco de Leste. E mesmo entre estes há dificuldades de acesso: Dynamo Kiev (sete presenças), Sparta Praga (seis), Spartak Moscovo (quatro), Lokomotiv Moscovo (três), Shakthar Donetsk (três) e CSKA Moscovo (duas) vinham todos de apenas três países (Ucrânia, Rep. Checa e Rússia). Só o Levski Sofia (Bulgária), o Artmedia Bratislava (Eslováquia), o Partizan Belgrado (Sérvia), o Steaua Bucareste (Roménia), o Maribor (Eslovénia) e o Croácia Zagreb (Croácia), com uma presença cada, furam o domínio daquele trio.
A questão agora é saber se, deixando-os jogar mais vezes, eles são capazes de evitar a eliminação sem honra que até aqui lhes marca todas as presenças.
Grandes momentos das provas europeias
Taça dos Campeões Europeus
A primeira competição europeia de futebol apareceu em 1955, um ano depois do nascimento da UEFA. Saiu da mente de Gabriel Hanot, jornalista do “L’Équipe” e teve uma primeira edição destinada a clubes convidados: por Portugal esteve o Sporting, que nem era campeão nacional. Em 1956, passou a destinar-se apenas aos campeões nacionais e ao vencedor da edição anterior.
As provas secundárias
Ao mesmo tempo, um suíço, Ernst Thommen, teve a ideia de organizar um torneio entre equipas de cidades que organizavam feiras de comércio. Nascia a Taça das Feiras, cuja primeira edição durou… três anos (1955-58) e que mais tarde foi reconvertida numa prova para os melhores classificados das Ligas e rebaptizada Taça UEFA. Em 1960 apareceu a Taça das Taças, para os vencedores das taças nacionais.
Liga dos Campeões
No final dos anos 80 começou a falar-se na criação de uma SuperLiga europeia entre os maiores clubes, de modo a aumentar as receitas de TV. A UEFA antecipou-se e, em 1991-92, mudou o formato da Taça dos Campeões, passando a incluir jogos em “poule” em vez da eliminação directa, condicionando os sorteios e, sobretudo, apostando no “marketing” centralizado. Estava descoberta a galinha dos ovos de ouro.
Extinção da Taça das Taças
A UEFA foi abrindo cada vez mais a porta aos grandes clubes, pelo que os pequenos se queixaram. Desta forma, primeiro extinguiu a pouco rentável Taça das Taças (a última foi em 1998-99), passando a qualificar os vencedores das taças para a Taça UEFA. E em 2004 incluiu também uma fase de grupos nesta competição, embora a uma só mão e, por isso, com menos jogos.
O que é o G-14
Criado em Setembro de 2000, o G-14 tomou este nome porque nele estavam representados 14 dos mais poderosos clubes de futebol europeus: três italianos (Milan, Inter e Juventus), dois espanhóis (Barcelona e Real Madrid), dois ingleses (Manchester United e Liverpool), dois alemães (Bayern Munique e Borussia Dortmund), dois franceses (Paris SG e Ol. Marselha), dois holandeses (Ajax e PSV Eindhoven) e um português (FC Porto). Em 2002, àqueles 14 clubes juntaram-se mais quatro (Arsenal, Leverkusen, Lyon e Valência), permitindo a Inglaterra, Alemanha, França e Espanha igualarem a Itália com três membros cada. De fora, continuam clubes poderosos, como o Chelsea, os dois grandes de Glasgow (Celtic e Rangers), o Anderlecht ou o Benfica, alegadamente para que os 18 membros não percam poder. “Os membros decidiram que a expansão do grupo só pode ser feita por convite”, explica Kurth, revelando que a prioridade é “a consolidação do grupo actual”.
ENTREVISTA
Thomas Kurth, director-geral do G-14 e um dos mentores da Liga dos Campeões, rejeita a ideia de “universalidade” preconizada por Platini
“O valor desportivo
não tem nacionalidade”
– Como reage ao anúncio, feito por Platini, de que pretende reduzir o número de vagas dos países mais poderosos na Liga dos Campeões?
– A Liga dos Campeões é a mais forte das competições europeias e é jogada pelas mais fortes equipas europeias. O número de participantes por país e o momento em que entram em prova são determinados por critérios puramente desportivos. Não nos parece que faça sentido trocar estes critérios baseados em resultados por outros, em detrimento da qualidade desportiva da competição, apenas para permitir que nela entrem equipas de mais países. Acreditamos que o novo presidente da UEFA apresentará pessoalmente as suas ideias aos nossos membros e a outros clubes que participam regularmente nas competições europeias e que estará disposto para lhes ouvir opiniões e expectativas.
- Mas não acha que a Liga dos Campeões ficaria a ganhar se mais países nela estivessem representados?
- De um ponto de vista puramente desportivo, o que interessa é ter as equipas mais fortes a competir umas contra as outras na Liga dos Campeões. O valor desportivo não está de forma alguma relacionado com a nacionalidade dos clubes e dos jogadores. Por isso, não: a prova não será melhor apenas porque mais países nela estejam representados, a não ser que as equipas desses países que habitualmente não estão envolvidos a ela acedam em resultado do seu mérito desportivo.
- A resposta dos clubes mais poderosos pode ser a criação de uma Liga europeia independente?
- Os clubes membros do G-14 não têm interesse na criação de uma Liga independente. Uma das suas prioridades é competir a nível doméstico, nos campeonatos e nas taças nacionais; outra é competir simultaneamente a nível europeu. A Liga dos Campeões é uma prova muito bem sucedida, tanto de um ponto de vista desportivo, como económico ou organizativo. Por isso não vemos necessidade de criar uma Liga Europeia privada.
- Mas alguma vez fizeram estudos de mercado com uma Super Liga europeia fechada, como a NBA, e jogada às quartas-feiras, dessa forma permitindo aos participantes continuar a jogar os campeonatos nacionais?
- Aderimos inteiramente ao princípio de qualificação através do mérito desportivo e de um sistema de subidas e descidas de divisão, pelo que nunca fizemos estudos com Ligas fechadas.
- Qual será o formato do futuro?
- Não podemos prevê-lo. Idealmente, será o resultado de discussões abertas e de uma permanente troca de ideias entre os clubes e a UEFA, nunca esquecendo as expectativas dos adeptos.
- E essa troca de ideias tem existido?
- Os membros do G-14 estão regularmente nas provas europeias e mantém múltiplos contactos com a UEFA. Esta sabe bem quais são as nossas ideias e expectativas.
- Michel Platini já tentou conhecê-las?
- Platini foi eleito presidente há um mês e, neste momento, estão a ser feitas consultas a clubes membros do G-14. Contudo, muito mais importantes que estas primeiras discussões são as mudanças no plano governativo que esperamos venham a ser feitas a longo prazo. Muitos dos problemas actuais e a fonte de inúmeros conflitos entre os clubes e as selecções nacionais poderão ser evitados se os clubes forem integrados no processo de tomada de decisões.
- É esse o objectivo do G-14 neste momento?
- A mera existência do G-14 garante que os interesses dos clubes de futebol em geral não podem continuar a ser ignorados pelos órgãos governativos. – A.T.
Publicado em Correio da Manhã, 3/3/2007
No final de Janeiro, Platini viu o seu programa para a presidência da UEFA ser aprovado por 27 das 52 federações votantes no congresso de Dussledorf. E no programa estava lá, bem clara, a promessa de universalidade. “Mantenhamos a Liga dos Campeões com o formato actual, mas reequilibremo-la em favor dos campeonatos nacionais. Instauremos assim um número máximo de três clubes directamente qualificados por país para permitir a participação a mais nações”. Lennart Johansson, o sueco sob cujo mandato nasceu a Liga dos Campeões e candidato derrotado nas eleições (teve 24 votos, uma vez que houve dois nulos) discordava e, nos dias que antecederam o escrutínio, matraqueou sem cessar na mesma tecla. “Não farei nenhuma mudança numa competição apreciada por jogadores e clubes e seguida por televisões do Mundo inteiro”, prometia Johansson, acenando ainda com os cinco mil milhões de euros de receitas geradas pela prova desde a sua criação, há 15 anos, e que tanto têm ajudado a enriquecer o futebol.
Assim que foi eleito, o novo presidente da UEFA teve de responder acerca deste ponto. Não revelou um plano concreto, ou pelo menos não foi além do que dissera antes. “Trata-se apenas do quarto classificado dos campeonatos mais poderosos. E somente em 2009. Nunca antes”, disse. Em suma, a partir de 2009/10 os três primeiros classificados do ranking UEFA (presentemente Espanha, Inglaterra e Itália, por esta ordem), deixarão de poder levar quatro equipas à Liga dos Campeões: se actualmente têm dois qualificados directamente e mais dois em pré-eliminatórias (que quase sempre se qualificam) passarão apenas a ter três apurados de forma directa e ninguém nas rondas preliminares. Desta forma se libertam três vagas na fase de grupos, que poderão ser disputadas de forma mais aberta por nações de outros países em rondas classificatórias sem os papões que impedem a tal universalidade. O que Platini não revelou ainda é se, como é previsível, este efeito universalista se alargará depois aos países colocados nos lugares imediatamente a seguir (França, Alemanha e Portugal), que actualmente têm a possibilidade de levar três equipas à Champions (duas de forma directa e uma através de uma eliminatória preliminar).
O voto nas eleições da UEFA é secreto, pelo que não se sabe quem votou no plano de regresso às origens de Platini, mas a reacção de satisfação dada na sala por Zbignew Boniek quando os resultados foram anunciados deve-se seguramente a mais do que uma relação pessoal amigável com o seu ex-colega da Juventus. É que Platini usou uma táctica digna de Blatter, rodeando-se de pobres e excluídos (que são muitos) e seguramente garantindo desde logo os seus votos. E o que são neste momento os países de Leste no grande mapa do futebol europeu senão pobres e excluídos? Nos oito anos em que usou o sistema actual, com 32 equipas na fase de grupos (um total de 256 vagas, portanto), a Liga dos Campeões só teve a jogá-la 12 equipas do antigo bloco de Leste. E mesmo entre estes há dificuldades de acesso: Dynamo Kiev (sete presenças), Sparta Praga (seis), Spartak Moscovo (quatro), Lokomotiv Moscovo (três), Shakthar Donetsk (três) e CSKA Moscovo (duas) vinham todos de apenas três países (Ucrânia, Rep. Checa e Rússia). Só o Levski Sofia (Bulgária), o Artmedia Bratislava (Eslováquia), o Partizan Belgrado (Sérvia), o Steaua Bucareste (Roménia), o Maribor (Eslovénia) e o Croácia Zagreb (Croácia), com uma presença cada, furam o domínio daquele trio.
A questão agora é saber se, deixando-os jogar mais vezes, eles são capazes de evitar a eliminação sem honra que até aqui lhes marca todas as presenças.
Grandes momentos das provas europeias
Taça dos Campeões Europeus
A primeira competição europeia de futebol apareceu em 1955, um ano depois do nascimento da UEFA. Saiu da mente de Gabriel Hanot, jornalista do “L’Équipe” e teve uma primeira edição destinada a clubes convidados: por Portugal esteve o Sporting, que nem era campeão nacional. Em 1956, passou a destinar-se apenas aos campeões nacionais e ao vencedor da edição anterior.
As provas secundárias
Ao mesmo tempo, um suíço, Ernst Thommen, teve a ideia de organizar um torneio entre equipas de cidades que organizavam feiras de comércio. Nascia a Taça das Feiras, cuja primeira edição durou… três anos (1955-58) e que mais tarde foi reconvertida numa prova para os melhores classificados das Ligas e rebaptizada Taça UEFA. Em 1960 apareceu a Taça das Taças, para os vencedores das taças nacionais.
Liga dos Campeões
No final dos anos 80 começou a falar-se na criação de uma SuperLiga europeia entre os maiores clubes, de modo a aumentar as receitas de TV. A UEFA antecipou-se e, em 1991-92, mudou o formato da Taça dos Campeões, passando a incluir jogos em “poule” em vez da eliminação directa, condicionando os sorteios e, sobretudo, apostando no “marketing” centralizado. Estava descoberta a galinha dos ovos de ouro.
Extinção da Taça das Taças
A UEFA foi abrindo cada vez mais a porta aos grandes clubes, pelo que os pequenos se queixaram. Desta forma, primeiro extinguiu a pouco rentável Taça das Taças (a última foi em 1998-99), passando a qualificar os vencedores das taças para a Taça UEFA. E em 2004 incluiu também uma fase de grupos nesta competição, embora a uma só mão e, por isso, com menos jogos.
O que é o G-14
Criado em Setembro de 2000, o G-14 tomou este nome porque nele estavam representados 14 dos mais poderosos clubes de futebol europeus: três italianos (Milan, Inter e Juventus), dois espanhóis (Barcelona e Real Madrid), dois ingleses (Manchester United e Liverpool), dois alemães (Bayern Munique e Borussia Dortmund), dois franceses (Paris SG e Ol. Marselha), dois holandeses (Ajax e PSV Eindhoven) e um português (FC Porto). Em 2002, àqueles 14 clubes juntaram-se mais quatro (Arsenal, Leverkusen, Lyon e Valência), permitindo a Inglaterra, Alemanha, França e Espanha igualarem a Itália com três membros cada. De fora, continuam clubes poderosos, como o Chelsea, os dois grandes de Glasgow (Celtic e Rangers), o Anderlecht ou o Benfica, alegadamente para que os 18 membros não percam poder. “Os membros decidiram que a expansão do grupo só pode ser feita por convite”, explica Kurth, revelando que a prioridade é “a consolidação do grupo actual”.
ENTREVISTA
Thomas Kurth, director-geral do G-14 e um dos mentores da Liga dos Campeões, rejeita a ideia de “universalidade” preconizada por Platini
“O valor desportivo
não tem nacionalidade”
– Como reage ao anúncio, feito por Platini, de que pretende reduzir o número de vagas dos países mais poderosos na Liga dos Campeões?
– A Liga dos Campeões é a mais forte das competições europeias e é jogada pelas mais fortes equipas europeias. O número de participantes por país e o momento em que entram em prova são determinados por critérios puramente desportivos. Não nos parece que faça sentido trocar estes critérios baseados em resultados por outros, em detrimento da qualidade desportiva da competição, apenas para permitir que nela entrem equipas de mais países. Acreditamos que o novo presidente da UEFA apresentará pessoalmente as suas ideias aos nossos membros e a outros clubes que participam regularmente nas competições europeias e que estará disposto para lhes ouvir opiniões e expectativas.
- Mas não acha que a Liga dos Campeões ficaria a ganhar se mais países nela estivessem representados?
- De um ponto de vista puramente desportivo, o que interessa é ter as equipas mais fortes a competir umas contra as outras na Liga dos Campeões. O valor desportivo não está de forma alguma relacionado com a nacionalidade dos clubes e dos jogadores. Por isso, não: a prova não será melhor apenas porque mais países nela estejam representados, a não ser que as equipas desses países que habitualmente não estão envolvidos a ela acedam em resultado do seu mérito desportivo.
- A resposta dos clubes mais poderosos pode ser a criação de uma Liga europeia independente?
- Os clubes membros do G-14 não têm interesse na criação de uma Liga independente. Uma das suas prioridades é competir a nível doméstico, nos campeonatos e nas taças nacionais; outra é competir simultaneamente a nível europeu. A Liga dos Campeões é uma prova muito bem sucedida, tanto de um ponto de vista desportivo, como económico ou organizativo. Por isso não vemos necessidade de criar uma Liga Europeia privada.
- Mas alguma vez fizeram estudos de mercado com uma Super Liga europeia fechada, como a NBA, e jogada às quartas-feiras, dessa forma permitindo aos participantes continuar a jogar os campeonatos nacionais?
- Aderimos inteiramente ao princípio de qualificação através do mérito desportivo e de um sistema de subidas e descidas de divisão, pelo que nunca fizemos estudos com Ligas fechadas.
- Qual será o formato do futuro?
- Não podemos prevê-lo. Idealmente, será o resultado de discussões abertas e de uma permanente troca de ideias entre os clubes e a UEFA, nunca esquecendo as expectativas dos adeptos.
- E essa troca de ideias tem existido?
- Os membros do G-14 estão regularmente nas provas europeias e mantém múltiplos contactos com a UEFA. Esta sabe bem quais são as nossas ideias e expectativas.
- Michel Platini já tentou conhecê-las?
- Platini foi eleito presidente há um mês e, neste momento, estão a ser feitas consultas a clubes membros do G-14. Contudo, muito mais importantes que estas primeiras discussões são as mudanças no plano governativo que esperamos venham a ser feitas a longo prazo. Muitos dos problemas actuais e a fonte de inúmeros conflitos entre os clubes e as selecções nacionais poderão ser evitados se os clubes forem integrados no processo de tomada de decisões.
- É esse o objectivo do G-14 neste momento?
- A mera existência do G-14 garante que os interesses dos clubes de futebol em geral não podem continuar a ser ignorados pelos órgãos governativos. – A.T.
Publicado em Correio da Manhã, 3/3/2007
A motivação do Bicho
No dia em que teve pela primeira vez o FC Porto como adversário, na sequência do Verão Quente de 1980, que ditou o afastamento de Pedroto e de vários jogadores e o levou a escolher o cargo de treinador-jogador do Penafiel como alternativa, António Oliveira mostrou-se como é na verdade. Rapou o bigode, fez meia dúzia de afirmações polémicas e levou com ele para as Antas o entretanto falecido “parapsicólogo” Lesaghi Zandinga. Antes do jogo, Zandinga fez questão de ser visto a esgravatar atrás de uma baliza e, talvez afectado pelo incidente, Fonseca foi uma sombra do guardião seguro que vinha sendo nessa época: já na segunda parte, sofreu dois golos nessa mesma baliza (um deles marcado pelo próprio Oliveira) e o jogo acabou empatado. Numa altura em que era raro os grandes desbaratarem assim pontos, foi um regresso memorável.
A história entrou para o folclore do futebol português, mas hoje não vem ao caso pela sua componente mística. Na perspectiva do FC Porto-Sp. Braga, que servirá para assinalar o regresso ao Dragão de Jorge Costa como adversário do clube que capitaneou durante tantos anos, o que importa é lembrar as razões pelas quais Oliveira levou Zandinga com ele: é que conhecia muito bem os ex-colegas, sabia que Fonseca tinha pavor de feitiços e conseguiu afectá-lo com um truque que não estava ao alcance de quem não tivesse com ele partilhado um balneário. É essa a grande vantagem de alguém que regressa a uma casa onde já foi personagem principal e que, além de Oliveira, outros têm aproveitado. Manuel Fernandes, por exemplo, perdeu por 4-3 na primeira vez que dirigiu uma equipa contra o Sporting que tantas vezes capitaneara, mas ganhou a segunda e fez sempre golos nos oito primeiros jogos. Oliveira não perdeu nenhum dos primeiros quatro jogos contra os “Dragões”. E ainda que se tenha estreado a perder por 5-0 contra o Benfica, Humberto Coelho, cuja experiência como treinador é mais limitada, levou o Salgueiros a um empate na primeira vez que recebeu o ex-clube e contribuiu para que os “encarnados” de Lisboa perdessem na recta final o título nacional de 1985/86
Jorge Costa já sabe o que é jogar contra o FC Porto: pelo Marítimo, quando ainda andava emprestado, até ganhou no Funchal (1-0) e fez um autogolo na derrota (1-3) nas Antas. Conhece os dois lados da história, mas como na altura ainda era muito jovem e não ascendera ao estatuto de símbolo do clube, não saberá o que vai sentir quando entrar no relvado e se encaminhar para o banco “dos outros”. Embora ainda seja cedo para se dizer se há ou não um Sp. Braga à Jorge Costa, os dois jogos que o ex-capitão portista leva à frente dos minhotos tiveram a sua marca, com vitórias em sofrimento contra o Parma e o E. Amadora, conseguidas nos instantes finais das partidas. Hoje, no Dragão, a essa capacidade para nunca desistir, o treinador bracarense juntará uma vontade enorme de brilhar contra os que tantas vezes o aplaudiram. Veremos se é suficiente para voltar a reabrir o campeonato.
O REGRESSO DOS CAPITÃES
António Oliveira contra o FC Porto
1980/81 FC Porto 2, Penafiel 2 a)
1980/81 Penafiel 0, FC Porto 0 a)
1982/83 FC Porto 0, Sporting 0 a)
1982/83 Sporting 3, FC Porto 3 a)
1985/86 FC Porto 4, Marítimo 2
1985/86 Marítimo 1, FC Porto 1
1987/88 V. Guimarães 0, FC Porto 0
1887/88 Académica 0, FC Porto 1
1988/89 FC Porto 1, Académica 0 b)
1991/92 FC Porto 1, Gil Vicente 0
1991/92 Gil Vicente 1, FC Porto 0
1993/94 Sp. Braga 0, FC Porto 2
1993/94 FC Porto 5, Sp. Braga 0
Balanço: 13 jogos, 1 vitória, 6 empates e 6 derrotas
Manuel Fernandes contra o Sporting
1988/89 Sporting 4, V. Setúbal 3
1988/89 V. Setúbal 1, Sporting 0
1989/90 V. Setúbal 1, Sporting 1
1990/91 E. Amadora 1, Sporting 2
1995/96 Sporting 7, Campomaiorense 1
1996/97 Sporting 2, V. Setúbal 1
1999/00 Santa Clara 2, Sporting 2
1999/00 Sporting 4, Santa Clara 1
2001/02 Sporting 0, Santa Clara 0
2001/02 Santa Clara 0, Sporting 3
2002/03 Sporting 2, Santa Clara 1
Balanço: 11 jogos, 1 vitória, 3 empates e 7 derrotas
Humberto Coelho contra o Benfica
1985/86 Benfica 5, Salgueiros 0
1985/86 Salgueiros 1, Benfica 1
1986/87 Benfica 2, Sp. Braga 1
Balanço: 3 jogos, 1 empate e 2 derrotas
a) Como treinador-jogador
b) Jogo da Taça de Portugal
DÚVIDAS LEGÍTIMAS
Porque se desliga o Sporting?
Depende. Contra o Aves, porque achava que as coisas acabariam sempre por correr bem, mesmo que não houvesse muito esforço. Contra a Académica, porque deixou o jogo esticar, ficou com as linhas muito afastadas e não só perdeu segurança na posse como deixou de ter rigor na defesa zonal. A inexperiência tem um preço.
Quem deve substituir Luisão?
David Luiz. Não porque Katsouranis não possa fazer bem a posição de central ou porque o brasileiro seja um craque, mas porque as desmarcações laterais de Katsouranis no meio-campo conferem amplitude ao jogo da equipa. Se, apesar disso, não jogar hoje, David Luiz fica a saber que não conta mesmo para Santos.
O que se passa com Postiga?
Se os momentos de plenitude goleadora têm sobretudo a ver com confiança e qualidade de trabalho, as “secas” devem ser atribuídas às razões inversas. Postiga parece hesitante em cada lance de área e, pela forma desastrada como tem feito algumas conclusões, deixa a ideia de que pode estar a trabalhar mal a finalização.
PÉ DE PÁGINA
CLARIVIDENTE. João Moutinho, já se sabe, tem uma cabeça de veterano num corpo de jovem esperança. É um jogador fantástico, que sabe de cor os terrenos que pisa, que liga uma equipa com o seu futebol de toque e sprint constante, que luta até não poder mais (e pode muito, como se vê na série de jogos consecutivos que leva feita pelos leões) e que empresta à equipa onde joga uma clarividência táctica muito acima da média.
ASSISTÊNCIA I. Tal como já tinha feito contra o V. Setúbal, na penúltima vez que o Sporting tivera pela frente um esquema de três defesas, cedo Moutinho compreendeu que havia ali um espaço a explorar: aos quatro minutos, a equipa variou rapidamente o jogo da direita para a esquerda, Moutinho conferiu-lhe profundidade nesse lado, apareceu nas costas do ala direito adversário e cruzou para um golo de Liedson.
ASSISTÊNCIA II. Na quarta-feira, a Académica voltou aos três defesas. E, aos quatro minutos, a história repetiu-se. Desta vez, Moutinho apareceu nas costas do ala esquerdo e voltou a cruzar para um golo de Liedson. Há muitas formas de alargar o 4x4x2 com meio-campo em losango: o Benfica faz Simão partir de uma zona central, o Sporting adianta Moutinho. Por isso, ambos são imprescindíveis.
Publicado em Record Dez, 3/3/2007
A história entrou para o folclore do futebol português, mas hoje não vem ao caso pela sua componente mística. Na perspectiva do FC Porto-Sp. Braga, que servirá para assinalar o regresso ao Dragão de Jorge Costa como adversário do clube que capitaneou durante tantos anos, o que importa é lembrar as razões pelas quais Oliveira levou Zandinga com ele: é que conhecia muito bem os ex-colegas, sabia que Fonseca tinha pavor de feitiços e conseguiu afectá-lo com um truque que não estava ao alcance de quem não tivesse com ele partilhado um balneário. É essa a grande vantagem de alguém que regressa a uma casa onde já foi personagem principal e que, além de Oliveira, outros têm aproveitado. Manuel Fernandes, por exemplo, perdeu por 4-3 na primeira vez que dirigiu uma equipa contra o Sporting que tantas vezes capitaneara, mas ganhou a segunda e fez sempre golos nos oito primeiros jogos. Oliveira não perdeu nenhum dos primeiros quatro jogos contra os “Dragões”. E ainda que se tenha estreado a perder por 5-0 contra o Benfica, Humberto Coelho, cuja experiência como treinador é mais limitada, levou o Salgueiros a um empate na primeira vez que recebeu o ex-clube e contribuiu para que os “encarnados” de Lisboa perdessem na recta final o título nacional de 1985/86
Jorge Costa já sabe o que é jogar contra o FC Porto: pelo Marítimo, quando ainda andava emprestado, até ganhou no Funchal (1-0) e fez um autogolo na derrota (1-3) nas Antas. Conhece os dois lados da história, mas como na altura ainda era muito jovem e não ascendera ao estatuto de símbolo do clube, não saberá o que vai sentir quando entrar no relvado e se encaminhar para o banco “dos outros”. Embora ainda seja cedo para se dizer se há ou não um Sp. Braga à Jorge Costa, os dois jogos que o ex-capitão portista leva à frente dos minhotos tiveram a sua marca, com vitórias em sofrimento contra o Parma e o E. Amadora, conseguidas nos instantes finais das partidas. Hoje, no Dragão, a essa capacidade para nunca desistir, o treinador bracarense juntará uma vontade enorme de brilhar contra os que tantas vezes o aplaudiram. Veremos se é suficiente para voltar a reabrir o campeonato.
O REGRESSO DOS CAPITÃES
António Oliveira contra o FC Porto
1980/81 FC Porto 2, Penafiel 2 a)
1980/81 Penafiel 0, FC Porto 0 a)
1982/83 FC Porto 0, Sporting 0 a)
1982/83 Sporting 3, FC Porto 3 a)
1985/86 FC Porto 4, Marítimo 2
1985/86 Marítimo 1, FC Porto 1
1987/88 V. Guimarães 0, FC Porto 0
1887/88 Académica 0, FC Porto 1
1988/89 FC Porto 1, Académica 0 b)
1991/92 FC Porto 1, Gil Vicente 0
1991/92 Gil Vicente 1, FC Porto 0
1993/94 Sp. Braga 0, FC Porto 2
1993/94 FC Porto 5, Sp. Braga 0
Balanço: 13 jogos, 1 vitória, 6 empates e 6 derrotas
Manuel Fernandes contra o Sporting
1988/89 Sporting 4, V. Setúbal 3
1988/89 V. Setúbal 1, Sporting 0
1989/90 V. Setúbal 1, Sporting 1
1990/91 E. Amadora 1, Sporting 2
1995/96 Sporting 7, Campomaiorense 1
1996/97 Sporting 2, V. Setúbal 1
1999/00 Santa Clara 2, Sporting 2
1999/00 Sporting 4, Santa Clara 1
2001/02 Sporting 0, Santa Clara 0
2001/02 Santa Clara 0, Sporting 3
2002/03 Sporting 2, Santa Clara 1
Balanço: 11 jogos, 1 vitória, 3 empates e 7 derrotas
Humberto Coelho contra o Benfica
1985/86 Benfica 5, Salgueiros 0
1985/86 Salgueiros 1, Benfica 1
1986/87 Benfica 2, Sp. Braga 1
Balanço: 3 jogos, 1 empate e 2 derrotas
a) Como treinador-jogador
b) Jogo da Taça de Portugal
DÚVIDAS LEGÍTIMAS
Porque se desliga o Sporting?
Depende. Contra o Aves, porque achava que as coisas acabariam sempre por correr bem, mesmo que não houvesse muito esforço. Contra a Académica, porque deixou o jogo esticar, ficou com as linhas muito afastadas e não só perdeu segurança na posse como deixou de ter rigor na defesa zonal. A inexperiência tem um preço.
Quem deve substituir Luisão?
David Luiz. Não porque Katsouranis não possa fazer bem a posição de central ou porque o brasileiro seja um craque, mas porque as desmarcações laterais de Katsouranis no meio-campo conferem amplitude ao jogo da equipa. Se, apesar disso, não jogar hoje, David Luiz fica a saber que não conta mesmo para Santos.
O que se passa com Postiga?
Se os momentos de plenitude goleadora têm sobretudo a ver com confiança e qualidade de trabalho, as “secas” devem ser atribuídas às razões inversas. Postiga parece hesitante em cada lance de área e, pela forma desastrada como tem feito algumas conclusões, deixa a ideia de que pode estar a trabalhar mal a finalização.
PÉ DE PÁGINA
CLARIVIDENTE. João Moutinho, já se sabe, tem uma cabeça de veterano num corpo de jovem esperança. É um jogador fantástico, que sabe de cor os terrenos que pisa, que liga uma equipa com o seu futebol de toque e sprint constante, que luta até não poder mais (e pode muito, como se vê na série de jogos consecutivos que leva feita pelos leões) e que empresta à equipa onde joga uma clarividência táctica muito acima da média.
ASSISTÊNCIA I. Tal como já tinha feito contra o V. Setúbal, na penúltima vez que o Sporting tivera pela frente um esquema de três defesas, cedo Moutinho compreendeu que havia ali um espaço a explorar: aos quatro minutos, a equipa variou rapidamente o jogo da direita para a esquerda, Moutinho conferiu-lhe profundidade nesse lado, apareceu nas costas do ala direito adversário e cruzou para um golo de Liedson.
ASSISTÊNCIA II. Na quarta-feira, a Académica voltou aos três defesas. E, aos quatro minutos, a história repetiu-se. Desta vez, Moutinho apareceu nas costas do ala esquerdo e voltou a cruzar para um golo de Liedson. Há muitas formas de alargar o 4x4x2 com meio-campo em losango: o Benfica faz Simão partir de uma zona central, o Sporting adianta Moutinho. Por isso, ambos são imprescindíveis.
Publicado em Record Dez, 3/3/2007
sexta-feira, 2 de março de 2007
Dúvidas Legítimas
Pode deixar aqui questões relacionadas com futebol e habilitar-se a vê-las respondidas na Record Dez do sábado seguinte. Sem medos.
Desp. Aves - Os cinco e o autocarro
Apesar de ter tido algumas ocasiões de golo e de – pelo menos nos primeiros 20 minutos – ter chegado com frequência à baliza de Ricardo, bem pode dizer-se que o Aves estacionou o autocarro frente à área de Nuno e só autorizou cinco jogadores a apearem-se de vez em quando: Pedro Geraldo, Jorge Ribeiro, Leandro, Futre e Hernâni. Numa equipa onde defender foi a palavra-chave, só estes homens totalizaram mais lances de posse de bola do que intervenções defensivas.
Elementos houve, como William, que nem queriam ter a bola nos pés: a primeira vez que alguém deu a bola ao defesa camaronês – e que ele logo despachou longa, para a bancada – foi aos 62’ e o autor da distracção foi Jorge Ribeiro. Feitas as contas, só 5 das 25 intervenções de William não foram para defender. Números semelhantes aos de Anilton, que apareceu como lateral-direito mas só teve a bola para lá do meio-campo três vezes em todo o desafio, pois tinha como incumbência seguir um dos pontas-de-lança do Sporting. Mesmo assim, à conta dos lançamentos laterais, Anilton ainda equilibrou os passes com as recuperações (22-22). Algo que não puderam fazer Sérgio Nunes (13 passes, 27 recuperações e uma falta), William (5-20-0), Filipe Anunciação (18-32-3) ou Mércio (20-23-4), mas que foi permitido a Pedro Geraldo (24-20-4) ou Jorge Ribeiro (30-10-1).
O foco do jogo do Aves era não deixar o Sporting jogar e isso foi conseguido. Com bola, a equipa optava sempre pela saída longa: não que fosse eficaz (a primeira vez que Nuno deu uma bola jogável foi aos 44’, porque a entregou à mão) mas porque assim ela ficava mais longe da baliza e porque os jogadores do Aves foram sempre muito mais fortes que os do Sporting nas segundas bolas. O jogo recomeçava, assim, em Filipe Anunciação, o principal recuperador avense, mas o objectivo era fazer ataque rápido pela direita (onde Leandro partia muito de trás, para compensar o desvio de Anilton para zonas interiores) ou ataque planeado pela esquerda, onde Pedro Geraldo podia sair ele próprio ou tabelar com Jorge Ribeiro. O destino era sempre o mesmo: dar a bola a Futre, o jogador que mais perto esteve de marcar.
ANUNCIAÇÃO
Campeão das recuperações
Foi enorme a prestação defensiva de Filipe Anunciação em Alvalade. É certo que do ponto de vista posicional nem sempre esteve bem, pois deixou-se levar pelo “10” leonino para muito perto dos centrais (11 recuperações na área e apenas 7 no meio-campo ofensivo), mas não pode menosprezar-se quem rouba 32 bolas ao adversário em 90 minutos de jogo. A principal preocupação de Anunciação era mesmo impedir o Sporting de jogar, pelo que nunca se coibiu de chutar a bola para a bancada (só um terço das suas recuperações originou entregas de bola a companheiros). Contudo, ninguém como ele conseguiu ligar a equipa: ao todo,
FUTRE
A baliza nos olhos
Foi dos pés de Artur Futre que saíram quase todos os remates feitos pelo Aves em Alvalade, como foi ele o único a tocar a bola dentro da área de Ricardo, num remate em antecipação a Caneira. No esquema inicial de Neca, alternou o centro e a esquerda com Hernâni, mas aparecia frequentemente à direita, a aproveitar o recolhimento de Leandro. Foi, aliás, desse lado, que chutou cinco vezes, todas ao lado das redes leoninas. Do lado esquerdo, privilegiava o serviço aos companheiros: acertou três passes na face esquerda do ataque, um deles uma assistência para uma conclusão de Jorge Ribeiro, contra nenhum na direita.
Publicado em Record, 28/2/2007
Elementos houve, como William, que nem queriam ter a bola nos pés: a primeira vez que alguém deu a bola ao defesa camaronês – e que ele logo despachou longa, para a bancada – foi aos 62’ e o autor da distracção foi Jorge Ribeiro. Feitas as contas, só 5 das 25 intervenções de William não foram para defender. Números semelhantes aos de Anilton, que apareceu como lateral-direito mas só teve a bola para lá do meio-campo três vezes em todo o desafio, pois tinha como incumbência seguir um dos pontas-de-lança do Sporting. Mesmo assim, à conta dos lançamentos laterais, Anilton ainda equilibrou os passes com as recuperações (22-22). Algo que não puderam fazer Sérgio Nunes (13 passes, 27 recuperações e uma falta), William (5-20-0), Filipe Anunciação (18-32-3) ou Mércio (20-23-4), mas que foi permitido a Pedro Geraldo (24-20-4) ou Jorge Ribeiro (30-10-1).
O foco do jogo do Aves era não deixar o Sporting jogar e isso foi conseguido. Com bola, a equipa optava sempre pela saída longa: não que fosse eficaz (a primeira vez que Nuno deu uma bola jogável foi aos 44’, porque a entregou à mão) mas porque assim ela ficava mais longe da baliza e porque os jogadores do Aves foram sempre muito mais fortes que os do Sporting nas segundas bolas. O jogo recomeçava, assim, em Filipe Anunciação, o principal recuperador avense, mas o objectivo era fazer ataque rápido pela direita (onde Leandro partia muito de trás, para compensar o desvio de Anilton para zonas interiores) ou ataque planeado pela esquerda, onde Pedro Geraldo podia sair ele próprio ou tabelar com Jorge Ribeiro. O destino era sempre o mesmo: dar a bola a Futre, o jogador que mais perto esteve de marcar.
ANUNCIAÇÃO
Campeão das recuperações
Foi enorme a prestação defensiva de Filipe Anunciação em Alvalade. É certo que do ponto de vista posicional nem sempre esteve bem, pois deixou-se levar pelo “10” leonino para muito perto dos centrais (11 recuperações na área e apenas 7 no meio-campo ofensivo), mas não pode menosprezar-se quem rouba 32 bolas ao adversário em 90 minutos de jogo. A principal preocupação de Anunciação era mesmo impedir o Sporting de jogar, pelo que nunca se coibiu de chutar a bola para a bancada (só um terço das suas recuperações originou entregas de bola a companheiros). Contudo, ninguém como ele conseguiu ligar a equipa: ao todo,
FUTRE
A baliza nos olhos
Foi dos pés de Artur Futre que saíram quase todos os remates feitos pelo Aves em Alvalade, como foi ele o único a tocar a bola dentro da área de Ricardo, num remate em antecipação a Caneira. No esquema inicial de Neca, alternou o centro e a esquerda com Hernâni, mas aparecia frequentemente à direita, a aproveitar o recolhimento de Leandro. Foi, aliás, desse lado, que chutou cinco vezes, todas ao lado das redes leoninas. Do lado esquerdo, privilegiava o serviço aos companheiros: acertou três passes na face esquerda do ataque, um deles uma assistência para uma conclusão de Jorge Ribeiro, contra nenhum na direita.
Publicado em Record, 28/2/2007
Mudanças de velocidade
1. O fim de semana futebolístico alargado voltou a dar uma imagem de um FC Porto enérgico, deixou adivinhar que o Benfica é a única equipa com pedalada para acompanhar os campeões e exibiu um Sporting acomodado, a ficar para trás. Por duas questões. A primeira prende-se com a capacidade de gerir um jogo, de ganhar sem fazer 90 minutos de alto nível: o FC Porto começou lento, a ver jogar o Beira Mar, mas soube ir à caixa de velocidades e acelerar até aos 5-0 finais; o Benfica arrancou a toda a brida, desacelerou a ponto de colocar os três pontos em risco (o Paços falhou o 2-2), mas ainda acordou a tempo de dar aspecto confortável à vantagem antes de voltar a repousar; o Sporting entrou a dormir contra o Aves e nem o raspanete de Paulo Bento ao intervalo elevou a equipa para patamares que justifiquem uma candidatura ao título. Sobretudo por causa da segunda questão: os desequilibradores. O FC Porto tem o Quaresma das trivelas, um Lisandro “on fire” e já saliva pelo regresso de Anderson; o Benfica tem um Simão eficaz, um Miccoli capaz de truques únicos e até voltou a ter um golo de Nuno Goems; no Sporting, com um plantel menos rico em opções, Nani anda em tribunal a queixar-se de que só ganha 11 mil euros por mês…
2. Atenção que o campeonato deu uma volta completa sobre si próprio. Antes do Natal, o FC Porto era campeão antecipado e o Benfica ganhava vantagem na luta pelo segundo lugar. Janeiro deu a ideia de um FC Porto em queda, de um Benfica incapaz de conviver com a pressão e de um Sporting em recuperação. Março terá um FC Porto-Sporting e um Benfica-FC Porto. Como será? Pode continuar a girar?
3. O Sporting joga amanhã grande parte da sua época. O desafio em casa com a Académica é fulcral, porque nele continua a decidir-se o troféu que os leões têm mais possibilidades de conquistar (e se não ganharem em Leiria e no Dragão provavelmente o único).
4. O Sp. Braga de Jorge Costa sofreu mas impôs ao E. Amadora a primeira derrota desde 5 de Novembro. Aos 90 minutos e depois de ter tido um jogo em Itália na quinta-feira. Veremos se chega para voltar a reabrir o campeonato quando visitar o Dragão.
5. Há cinco pontos entre o quinto e o 11º classificado. A luta pela UEFA vai ferver.
Publicado em Correio da Manhã, 27/2/2007
2. Atenção que o campeonato deu uma volta completa sobre si próprio. Antes do Natal, o FC Porto era campeão antecipado e o Benfica ganhava vantagem na luta pelo segundo lugar. Janeiro deu a ideia de um FC Porto em queda, de um Benfica incapaz de conviver com a pressão e de um Sporting em recuperação. Março terá um FC Porto-Sporting e um Benfica-FC Porto. Como será? Pode continuar a girar?
3. O Sporting joga amanhã grande parte da sua época. O desafio em casa com a Académica é fulcral, porque nele continua a decidir-se o troféu que os leões têm mais possibilidades de conquistar (e se não ganharem em Leiria e no Dragão provavelmente o único).
4. O Sp. Braga de Jorge Costa sofreu mas impôs ao E. Amadora a primeira derrota desde 5 de Novembro. Aos 90 minutos e depois de ter tido um jogo em Itália na quinta-feira. Veremos se chega para voltar a reabrir o campeonato quando visitar o Dragão.
5. Há cinco pontos entre o quinto e o 11º classificado. A luta pela UEFA vai ferver.
Publicado em Correio da Manhã, 27/2/2007
Como se faz um bom treinador
A troca de insultos entre Jaime Pacheco e José Mourinho, dois treinadores que, cada um à sua maneira – e de maneiras diametralmente diferentes –, apresentaram resultados, devia ter pelo menos um mérito: lançar o debate acerca de quem deve poder ser treinador de uma equipa de alto nível. Porque, se a coisa arrancou à conta da promoção de Jorge Costa a técnico principal do Braga e o “Bicho” até ganhou em Parma o primeiro jogo aos comandos, também já podia ter sido motivada pela ascensão de muitos outros dos que, provadamente competentes, são obrigados a recorrer ao adjunto com curso de quarto nível e braçadeira de chefe de equipa.
E o problema não é só português – alarga-se à UEFA. Paulo Bento, por exemplo, depois de ter levado o Sporting a uma série de mais de uma dezena de vitórias seguidas e de ter elevado a equipa ao segundo lugar da Liga portuguesa, foi obrigado a tirar o nome das fichas de jogo na Liga dos Campeões para a qual se qualificou, colocando lá o do adjunto Carlos Pereira, pela simples razão de que este era encartado e ele não. O que leva à pergunta: afinal com o que é que se faz um bom treinador? Tenho duas coisas como certas. A primeira é que não é com um diploma, passado pela Associação Nacional de Treinadores ou por uma faculdade que formam professores especializados. A segunda é que, nos tempos que se vivem hoje – quando a praxis é cada vez menos fundamental para o conhecimento – não há uma resposta concreta e definitiva, tão díspares podem ser as referências de um caso de sucesso.
Há bons treinadores sem formação académica mas com experiência de campo, como Paulo Bento. Contudo, também há bons treinadores sem experiência de campo mas com formação específica, como Arrigo Sacchi. E há bons treinadores que aprenderam a mitigar a falta de experiência de campo respirando desde cedo o ar do balneário e lhe juntaram formação académica e específica, como é o caso de José Mourinho. Para ser bom treinador não é preciso ter sido bom jogador – Wenger, Scolari, Queiroz, para não citar mais, foram futebolistas medíocres – mas o facto de ter sido bom de calções também não invalida que se seja ainda melhor aos comandos. E hoje em dia, até pela influência devastadora que tem tido a modernidade discursiva – cheia de basculações e transições que os homens da tarimba se recusam a aceitar, como se dessa forma se mantivessem permanentemente actualizados – parece estar a cavar-se um fosso intransponível entre os dois campos.
Um bom treinador é aquele que, com este ou aquele método, tira dos meios à disposição mais do que o exigível. Pacheco fê-lo quando levou o Boavista ao título nacional apelando à superação constante dos jogadores, numa abordagem mais emocional. Mourinho fê-lo quando ganhou todos os campeonatos que jogou de princípio a fim, tanto no FC Porto como no Chelsea, recorrendo a um misto de conhecimento científico com intuição pura. E nada disso se aprende num curso de meia dúzia de dias em Rio Maior.
Publicado em Sábado, 28/2/2007
E o problema não é só português – alarga-se à UEFA. Paulo Bento, por exemplo, depois de ter levado o Sporting a uma série de mais de uma dezena de vitórias seguidas e de ter elevado a equipa ao segundo lugar da Liga portuguesa, foi obrigado a tirar o nome das fichas de jogo na Liga dos Campeões para a qual se qualificou, colocando lá o do adjunto Carlos Pereira, pela simples razão de que este era encartado e ele não. O que leva à pergunta: afinal com o que é que se faz um bom treinador? Tenho duas coisas como certas. A primeira é que não é com um diploma, passado pela Associação Nacional de Treinadores ou por uma faculdade que formam professores especializados. A segunda é que, nos tempos que se vivem hoje – quando a praxis é cada vez menos fundamental para o conhecimento – não há uma resposta concreta e definitiva, tão díspares podem ser as referências de um caso de sucesso.
Há bons treinadores sem formação académica mas com experiência de campo, como Paulo Bento. Contudo, também há bons treinadores sem experiência de campo mas com formação específica, como Arrigo Sacchi. E há bons treinadores que aprenderam a mitigar a falta de experiência de campo respirando desde cedo o ar do balneário e lhe juntaram formação académica e específica, como é o caso de José Mourinho. Para ser bom treinador não é preciso ter sido bom jogador – Wenger, Scolari, Queiroz, para não citar mais, foram futebolistas medíocres – mas o facto de ter sido bom de calções também não invalida que se seja ainda melhor aos comandos. E hoje em dia, até pela influência devastadora que tem tido a modernidade discursiva – cheia de basculações e transições que os homens da tarimba se recusam a aceitar, como se dessa forma se mantivessem permanentemente actualizados – parece estar a cavar-se um fosso intransponível entre os dois campos.
Um bom treinador é aquele que, com este ou aquele método, tira dos meios à disposição mais do que o exigível. Pacheco fê-lo quando levou o Boavista ao título nacional apelando à superação constante dos jogadores, numa abordagem mais emocional. Mourinho fê-lo quando ganhou todos os campeonatos que jogou de princípio a fim, tanto no FC Porto como no Chelsea, recorrendo a um misto de conhecimento científico com intuição pura. E nada disso se aprende num curso de meia dúzia de dias em Rio Maior.
Publicado em Sábado, 28/2/2007
Carlos Calado - O Dean do atletismo
O mito de James Dean fez viver a máxima “vive depressa, morre jovem e conserva um belo cadáver”. Carlos Calado, velocista e saltador ribatejano que fez o país acordar para as disciplinas técnicas, esteve para o atletismo como o actor de Indiana para o cinema: chegou depressa ao cume, talvez depressa demais, e não aguentou o balanço.
Carlos Calado nasceu a 5 de Outubro de 1975 em Alcanena, onde de resto há um pavilhão com o nome dele. Ainda vestia a camisola do Clube de Natação de Rio Maior qaundo foi o primeiro português a saltar mais de oito metros em condições regulamentares. Fê-lo com 20 anos, a mesma idade com que superou os 17 metros no triplo salto. A fama permitiu-lhe integrar o lote de eleitos de Moniz Pereira, que começava a construir no Sporting uma equipa de atletismo que fosse além dos tradicionais crosse e meio-fundo. E Calado correspondeu, alargando a actividade aos 100 metros, onde esteve perto da barreira dos 10 segundos – ficou a 11 centésimos, em 1999 – e trazendo para Portugal medalhas em disciplinas técnicas: foi campeão europeu do comprimento em 1998 e terceiro nos Mundiais ao ar livre e em pista coberta em 2001. Ainda conserva o recorde nacional de salto em comprimento (8,36m) estabelecido em 1997.
Com os resultados, contudo, veio o outro lado de James Dean, o dado aos excessos. Os carros, a boa vida, os desfiles de moda, a vida nocturna… e as lesões, que foram de infecções urinárias a contracturas e fracturas de esforço, levaram-no a viajar de desilusão em desilusão a uma velocidade superior à que atingia em pista. Rompeu com o Sporting no final de 2003, quando o clube cortou no pagamento aos atletas, assinou pelo FC Porto e trocou Miguel Lucas, treinador de sempre, por Fausto Ribeiro. Os treinos passaram a ser controlados à distância e, como ganhava menos e não guardara nada, passou a ter de concentrar-se noutras actividades, como o bar Pharmácia, que reabriu em Alcanena. Talvez por isso, a ligação não resultou e, um ano depois, Calado assinou pelo Bairro dos Anjos, ao mesmo tempo que se inscrevia na equipa de saltos da Universidade de Oviedo, em Espanha, onde passava a contar com Juan José Azpeitia – treinador de Yago Lamela – como técnico.
Em 2005, depois de falhar os Jogos Olímpicos de Atenas, assinou pelo Benfica, mas já era uma sombra do atleta que encantara multidões. Felizmente para ele, Calado não levou o mito-Dean até ao fim [James Dean morreu aos 24 anos, numa colisão frontal, ao volante de um Porsche 550 Spyder] e, no último ano, arrastou-se pelas pistas, não passando dos 7,07m nos Nacionais. De qualquer modo, Dean pode ser um mito, mas actor a sério era o Marlon Brando, que morreu velho e gordo.
Publicado em Correio da Manhã, 24/2/2007
Carlos Calado nasceu a 5 de Outubro de 1975 em Alcanena, onde de resto há um pavilhão com o nome dele. Ainda vestia a camisola do Clube de Natação de Rio Maior qaundo foi o primeiro português a saltar mais de oito metros em condições regulamentares. Fê-lo com 20 anos, a mesma idade com que superou os 17 metros no triplo salto. A fama permitiu-lhe integrar o lote de eleitos de Moniz Pereira, que começava a construir no Sporting uma equipa de atletismo que fosse além dos tradicionais crosse e meio-fundo. E Calado correspondeu, alargando a actividade aos 100 metros, onde esteve perto da barreira dos 10 segundos – ficou a 11 centésimos, em 1999 – e trazendo para Portugal medalhas em disciplinas técnicas: foi campeão europeu do comprimento em 1998 e terceiro nos Mundiais ao ar livre e em pista coberta em 2001. Ainda conserva o recorde nacional de salto em comprimento (8,36m) estabelecido em 1997.
Com os resultados, contudo, veio o outro lado de James Dean, o dado aos excessos. Os carros, a boa vida, os desfiles de moda, a vida nocturna… e as lesões, que foram de infecções urinárias a contracturas e fracturas de esforço, levaram-no a viajar de desilusão em desilusão a uma velocidade superior à que atingia em pista. Rompeu com o Sporting no final de 2003, quando o clube cortou no pagamento aos atletas, assinou pelo FC Porto e trocou Miguel Lucas, treinador de sempre, por Fausto Ribeiro. Os treinos passaram a ser controlados à distância e, como ganhava menos e não guardara nada, passou a ter de concentrar-se noutras actividades, como o bar Pharmácia, que reabriu em Alcanena. Talvez por isso, a ligação não resultou e, um ano depois, Calado assinou pelo Bairro dos Anjos, ao mesmo tempo que se inscrevia na equipa de saltos da Universidade de Oviedo, em Espanha, onde passava a contar com Juan José Azpeitia – treinador de Yago Lamela – como técnico.
Em 2005, depois de falhar os Jogos Olímpicos de Atenas, assinou pelo Benfica, mas já era uma sombra do atleta que encantara multidões. Felizmente para ele, Calado não levou o mito-Dean até ao fim [James Dean morreu aos 24 anos, numa colisão frontal, ao volante de um Porsche 550 Spyder] e, no último ano, arrastou-se pelas pistas, não passando dos 7,07m nos Nacionais. De qualquer modo, Dean pode ser um mito, mas actor a sério era o Marlon Brando, que morreu velho e gordo.
Publicado em Correio da Manhã, 24/2/2007
Enfermaria F. C.
Os principais clubes portugueses entraram já na modernidade e apostam na prevenção de lesões antes de ser necessário debelá-las. Conscientes de que a maioria das lesões – as não-traumáticas, pelo menos – são evitáveis através de uma planificação cuidada e da qualidade do trabalho, passaram a ter nas suas equipas técnicas especialistas em metodologia e investem mais nisso do que nos equipamentos destinados a diagnosticar e recuperar os jogadores.
“O segredo do sucesso é a prevenção, a aposta na triologia treino-alimentação-descanso. E não serve de nada fazer bem duas destas coisas e depois falhar noutra. Se um jogador treina bem, faz uma alimentação adequada mas depois gosta de sair à noite, de fazer uma vida desregrada, fica mais susceptível às lesões. E o mesmo sucede se treina bem, se descansa bem, mas come mal”, explica Mariano Barreto, actual treinador da Naval, mas com uma longa carreira como eixo de ligação entre o departamento médico e técnico do Sporting e, depois, como recuperador, acompanhando Paulo Sousa em vários clubes estrangeiros de topo.
Tendo qualidade no trabalho, fica muito mais fácil evitar as lesões. Mas é claro que não é possível erradicá-las. Esta época, por exemplo, o Sporting tem tido pouquíssimas lesões musculares, enquanto a mais mediática lesão sofrida por um jogador do FC Porto, o brasileiro Anderson, foi de cariz traumático. O foco assenta, desta forma, no Benfica, onde as lesões se têm acumulado e ganha maior importância outro aspecto: a qualidade dos diagnósticos. Há Mantorras, cujo médico, o espanhol Ramon Cugat, já revelou que era da opinião de que o angolano devia ter optado pela colocação de um novo menisco, mas que o jogador preferiu a solução de recuperação mais rápida – e de menor possibilidade de sucesso – abrindo assim caminho a uma vida de suplícios: tem que fazer ginásio além da carga normal de trabalho dos colegas e, mesmo assim, nas palavras de Fernando Santos, treinador do clube, “não pode fazer 90 minutos”.
Foi também Fernando Santos quem abriu o debate em torno de Miccoli, dizendo que o italiano tem propensão para engordar e que a estrutura muscular não aguenta o excesso de peso. O jogador não gostou de ver debatida a sua camada adiposa, mas a verdade é que desde o início da época está a fazer trabalho específico de fortalecimento muscular e virado para a perda de peso, tendo por isso mesmo sido o único elemento a falhar, por exemplo, a deslocação ao Dubai, em Janeiro.
E há, obviamente, o caso Rui Costa, cuja paragem prolongada se deveu à incapacidade de descobrir uma rotura muscular gigantesca numa ecografia. “Um diagnóstico errado pode deitar por terra todo o trabalho feito”, considera Mariano Barreto, que se prepara para voltar a dar tempo de jogo a um dos jogadores mais sacrificados pelas lesões da história do futebol português: o médio Delfim. Após vários problemas nos joelhos, no Olympique Marselha provocaram-lhe uma lesão grave na coluna vertebral por erro de diagnóstico: teve de colocar quatro parafusos na coluna, correu riscos de ser atirado para uma cadeira de rodas para toda a vida mas voltará a jogar.
Seguro obrigatório
Embora fiquem prejudicados do ponto de vista desportivo, por não poderem contar com os jogadores, os clubes não perdem nada financeiramente por causa de uma lesão grave, pois a inscrição de um futebolista na Liga só pode ser feita mediante a apresentação de um certificado de seguro desportivo, com cobertura de doença e invalidez profissional, bem como de um certificado de seguro de acidentes de trabalho. O facto motivou mesmo alguns problemas, por exemplo, no caso de Mantorras: o Benfica teve de esforçar-se para convencer a seguradora de que o angolano ainda podia jogar ao mais alto nível.
Os mais sujeitos a lesões traumáticas
Todo o trabalho de prevenção para evitar lesões é válido sobretudo em questões musculares, uma vez que as lesões traumáticas, nascidas em choques com adversários, não dependem do treino mas sim da forma como se joga. “Um jogador ofensivo, que privilegia o drible, que gosta de atacar o defesa, está muito mais sujeito a elas do que um defesa ou um médio daqueles que recebe a bola e a passa logo. Tal como corre mais riscos um avançado, que joga na área, mesmo que seja só para concluir, pois aí há menos espaços, as marcações são mais pressionantes e há uma maior propensão para o choque”, explica Mariano Barreto.
Contudo, há sempre excepções a confirmar a regra. Fruto de uma agilidade acima da média, de uma capacidade invulgar de fugir ao toque, o homem com mais jogos em toda a história do campeonato português, o avançado Manuel Fernandes, raramente se lesionava. Ao todo fez 485 partidas no campeonato e, em doze anos de Sporting, falhou apenas 34 partidas. Nem todas por lesão, obviamente, o que mais contribui para estabelecer o contraste, por exemplo, com o seu parceiro habitual de ataque, Rui Jordão. Em nove anos de Alvalade, nos quais sofreu duas lesões gravíssimas, o angolano teve de falhar 63 jogos de campeonato.
Jogadores preferem recuperador de confiança
Poucos clubes escolhem investir em material de diagnóstico e recuperação, sobretudo porque ele é caríssimo e raras vezes utilizado, porque nessas alturas é sempre possível recorrer a clínicas privadas e especializadas, mas também porque alguns jogadores optam depois por fazer a recuperação com quem conhecem bem. Mariano Barreto andou pela Europa quase como treinador-privado de Paulo Sousa depois de o jogador ter tido problemas na Juventus e isso ainda lhe permitiu jogar mais uns anos. E é sabido, por exemplo, que António Gaspar, ex-fisioterapeuta do Benfica, actualmente na selecção nacional, continua a acompanhar vários profissionais de clubes da Liga. Porquê? Porque a recuperação fica facilitada se for feita por alguém em quem o jogador confia inteiramente. E, além do mais, em caso de erro de diagnóstico – como foi o caso de Rui Costa, este ano – a culpa pode sempre morrer solteira.
ENFERMARIA F.C.
Pedro
Paços de Ferreira
Ainda não se estreou esta época e já sabe que não o fará, pois o regresso ao activo não acontecerá antes do Verão. Merece o prémio do azar pelo aspecto caricatural do que foi a sua época: começou por fazer uma rotura de ligamentos, da qual recuperou, mas apenas fracturar a rótula do joelho esquerdo. Numa visita ao centro médico, para apreciar a cicatrização, escorregou e teve de voltar a ser operado. Um ano para esquecer.
Tambussi
Boavista
Pisou mal a relva, nos primeiros minutos do jogo com o Marítimo, a 12 de Janeiro, e fez uma rotura do ligamento cruzado anterior do joelho direito, que o deve manter de fora entre “seis e oito meses”. Mas já na pré-época se tinha lesionado na face, o que o obrigou a jogar de máscara. Mais tarde, a 29 de Agosto, num treino, fez uma fissura no primeiro dedo do pé direito, que o levou a mais três semanas de paragem.
Pedro Emanuel
FC Porto
Outro que vai passar pela época sem jogar. A 12 de Agosto, no aquecimento para o jogo particular com o Manchester City, sofreu uma rotura total do tendão de aquiles do pé esquerdo. Quando parecia estar na fase final da recuperação começou a sentir dores e teve de voltar a ser operado, para debelar uma necrose parcial do tendão afectado. Vai passar o resto do campeonato em tratamento, para poder regressar em 2007/08.
Hugo
V. Setúbal
Começou por fazer uma distensão no adutor da perna direita, em jogo da Taça UEFA, com o Hereenveen, a 28 de Setembro. Regressou à competição já em Novembro mas, ao segundo jogo, frente ao Braga, no dia 27, fez uma entorse no joelho esquerdo que o afastou até ao Ano Novo. Ainda realizou mais um par de jogos até que, num treino, fez ontem uma semana, fracturou o menisco do joelho esquerdo. Talvez volte antes do fim da época.
Adalto
V. Setúbal
Regressou à competição no sábado passado, frente ao Boavista, cinco meses depois do último jogo, precisamente com o mesmo adversário. Tudo por causa de uma pubalgia que começou por o incomodar e que, por não estar a evoluir de forma satisfatória com repouso a que foi submetido, acabou por levá-lo a uma intervenção cirúrgica, já o mês de Outubro ia avançado.
Madrid
Sp. Braga
Em clima de euforia pela vitória contra o Benfica, dois dias antes, começou por fazer uma entorse na tibiotársica, a 20 de Novembro, e ficou de fora por mais de um mês. Em Janeiro, ainda foi a tempo de alinhar na dupla ronda da Taça, mas antes do regresso do campeonato, quando se falava numa transferência para o FC Porto, fez uma microrrotura muscular que está a revelar-se de difícil resolução.
Rui Costa
Benfica
Na estreia oficial pelo clube, na Luz contra o Áustria de Viena, contraiu uma rotura muscular de quatro milímetros. Saiu e parou quinze dias, até ao primeiro jogo do Benfica na Liga, no qual se ressentiu. Foi-lhe diagnosticado um edema e, três semanas depois, quando se julgava que o problema estava debelado, voltou a jogar. Agravou o que afinal era uma rotura muscular na coxa direita e teve de parar mais três meses. No domingo, teve de sair do confronto com o Nacional, mas a microrrotura na coxa direita não tem nada a ver com a lesão anterior e não o deve obrigar a muito mais que duas semanas de paragem.
Anderson
FC Porto
Um choque com o grego Katsouranis, no FC Porto-Benfica de 28 de Outubro, fracturou-lhe o perónio da perna direita e afectou-lhe alguns ligamentos na zona do tornozelo. Foi operado dois dias depois e os médicos avançaram com um período de paragem nunca inferior a três meses. E, três meses depois, no final de Janeiro, começou a trabalhar no ginásio. Segue-se o regresso aos relvados e espera-se que em Março volte a jogar.
Maciel
Sp. Braga
Lesionou-se logo num dos primeiros lances da deslocação a Setúbal, a 27 de Novembro. Fez um traumatismo do joelho direito e passou a treinar condicionado. A 14 de Dezembro, jogou com o Grasshopper e, apesar de ainda ser convocado para o jogo seguinte, percebeu que não estava bem. Teve de ser operado ao menisco antes do Natal e só na semana passada reiniciou a preparação no relvado.
Miccoli
Benfica
Tudo começou no excesso de peso: veio de férias e foi-lhe dado um plano de treinos específico para perder peso. Entrou em competição a 17 de Setembro e por lá esteve até 6 de Dezembro, quando fez uma microrrotura na coxa esquerda. Parou, voltou ao treino específico e defrontou a Académica, a 15 de Janeiro, mas só para se queixar de uma tendinite no joelho esquerdo que o afastou por mais três semanas. E já está de volta.
Hélder Barbosa
Académica
Emprestado pelo FC Porto, lesionou-se a 24 de Novembro, num choque durante um jogo-treino com o Pampilhosa. A rotura no tendão rotuliano da perna esquerda levou-o à mesa de operações e deve mantê-lo afastado da competição. Está a recuperar no centro de estágio portista, mas há a expectativa de, com sorte, poder alinhar nos últimos dois jogos da época, após um período de cinco meses de afastamento.
Outros candidatos ao onze
A selecção que se vê abaixo foi formada, posição a posição, pelos jogadores cujas lesões foram, ao mesmo tempo, mais duradouras e mediáticas. Outros podiam integrá-la, como Roma (Beira-Mar), Diakité (Beira-Mar), Fernando (Belenenses), Amaral (Belenenses) ou Mário Silva (Boavista). Ficam no banco.
Publicado em Correio da Manhã, 24/2/2007
“O segredo do sucesso é a prevenção, a aposta na triologia treino-alimentação-descanso. E não serve de nada fazer bem duas destas coisas e depois falhar noutra. Se um jogador treina bem, faz uma alimentação adequada mas depois gosta de sair à noite, de fazer uma vida desregrada, fica mais susceptível às lesões. E o mesmo sucede se treina bem, se descansa bem, mas come mal”, explica Mariano Barreto, actual treinador da Naval, mas com uma longa carreira como eixo de ligação entre o departamento médico e técnico do Sporting e, depois, como recuperador, acompanhando Paulo Sousa em vários clubes estrangeiros de topo.
Tendo qualidade no trabalho, fica muito mais fácil evitar as lesões. Mas é claro que não é possível erradicá-las. Esta época, por exemplo, o Sporting tem tido pouquíssimas lesões musculares, enquanto a mais mediática lesão sofrida por um jogador do FC Porto, o brasileiro Anderson, foi de cariz traumático. O foco assenta, desta forma, no Benfica, onde as lesões se têm acumulado e ganha maior importância outro aspecto: a qualidade dos diagnósticos. Há Mantorras, cujo médico, o espanhol Ramon Cugat, já revelou que era da opinião de que o angolano devia ter optado pela colocação de um novo menisco, mas que o jogador preferiu a solução de recuperação mais rápida – e de menor possibilidade de sucesso – abrindo assim caminho a uma vida de suplícios: tem que fazer ginásio além da carga normal de trabalho dos colegas e, mesmo assim, nas palavras de Fernando Santos, treinador do clube, “não pode fazer 90 minutos”.
Foi também Fernando Santos quem abriu o debate em torno de Miccoli, dizendo que o italiano tem propensão para engordar e que a estrutura muscular não aguenta o excesso de peso. O jogador não gostou de ver debatida a sua camada adiposa, mas a verdade é que desde o início da época está a fazer trabalho específico de fortalecimento muscular e virado para a perda de peso, tendo por isso mesmo sido o único elemento a falhar, por exemplo, a deslocação ao Dubai, em Janeiro.
E há, obviamente, o caso Rui Costa, cuja paragem prolongada se deveu à incapacidade de descobrir uma rotura muscular gigantesca numa ecografia. “Um diagnóstico errado pode deitar por terra todo o trabalho feito”, considera Mariano Barreto, que se prepara para voltar a dar tempo de jogo a um dos jogadores mais sacrificados pelas lesões da história do futebol português: o médio Delfim. Após vários problemas nos joelhos, no Olympique Marselha provocaram-lhe uma lesão grave na coluna vertebral por erro de diagnóstico: teve de colocar quatro parafusos na coluna, correu riscos de ser atirado para uma cadeira de rodas para toda a vida mas voltará a jogar.
Seguro obrigatório
Embora fiquem prejudicados do ponto de vista desportivo, por não poderem contar com os jogadores, os clubes não perdem nada financeiramente por causa de uma lesão grave, pois a inscrição de um futebolista na Liga só pode ser feita mediante a apresentação de um certificado de seguro desportivo, com cobertura de doença e invalidez profissional, bem como de um certificado de seguro de acidentes de trabalho. O facto motivou mesmo alguns problemas, por exemplo, no caso de Mantorras: o Benfica teve de esforçar-se para convencer a seguradora de que o angolano ainda podia jogar ao mais alto nível.
Os mais sujeitos a lesões traumáticas
Todo o trabalho de prevenção para evitar lesões é válido sobretudo em questões musculares, uma vez que as lesões traumáticas, nascidas em choques com adversários, não dependem do treino mas sim da forma como se joga. “Um jogador ofensivo, que privilegia o drible, que gosta de atacar o defesa, está muito mais sujeito a elas do que um defesa ou um médio daqueles que recebe a bola e a passa logo. Tal como corre mais riscos um avançado, que joga na área, mesmo que seja só para concluir, pois aí há menos espaços, as marcações são mais pressionantes e há uma maior propensão para o choque”, explica Mariano Barreto.
Contudo, há sempre excepções a confirmar a regra. Fruto de uma agilidade acima da média, de uma capacidade invulgar de fugir ao toque, o homem com mais jogos em toda a história do campeonato português, o avançado Manuel Fernandes, raramente se lesionava. Ao todo fez 485 partidas no campeonato e, em doze anos de Sporting, falhou apenas 34 partidas. Nem todas por lesão, obviamente, o que mais contribui para estabelecer o contraste, por exemplo, com o seu parceiro habitual de ataque, Rui Jordão. Em nove anos de Alvalade, nos quais sofreu duas lesões gravíssimas, o angolano teve de falhar 63 jogos de campeonato.
Jogadores preferem recuperador de confiança
Poucos clubes escolhem investir em material de diagnóstico e recuperação, sobretudo porque ele é caríssimo e raras vezes utilizado, porque nessas alturas é sempre possível recorrer a clínicas privadas e especializadas, mas também porque alguns jogadores optam depois por fazer a recuperação com quem conhecem bem. Mariano Barreto andou pela Europa quase como treinador-privado de Paulo Sousa depois de o jogador ter tido problemas na Juventus e isso ainda lhe permitiu jogar mais uns anos. E é sabido, por exemplo, que António Gaspar, ex-fisioterapeuta do Benfica, actualmente na selecção nacional, continua a acompanhar vários profissionais de clubes da Liga. Porquê? Porque a recuperação fica facilitada se for feita por alguém em quem o jogador confia inteiramente. E, além do mais, em caso de erro de diagnóstico – como foi o caso de Rui Costa, este ano – a culpa pode sempre morrer solteira.
ENFERMARIA F.C.
Pedro
Paços de Ferreira
Ainda não se estreou esta época e já sabe que não o fará, pois o regresso ao activo não acontecerá antes do Verão. Merece o prémio do azar pelo aspecto caricatural do que foi a sua época: começou por fazer uma rotura de ligamentos, da qual recuperou, mas apenas fracturar a rótula do joelho esquerdo. Numa visita ao centro médico, para apreciar a cicatrização, escorregou e teve de voltar a ser operado. Um ano para esquecer.
Tambussi
Boavista
Pisou mal a relva, nos primeiros minutos do jogo com o Marítimo, a 12 de Janeiro, e fez uma rotura do ligamento cruzado anterior do joelho direito, que o deve manter de fora entre “seis e oito meses”. Mas já na pré-época se tinha lesionado na face, o que o obrigou a jogar de máscara. Mais tarde, a 29 de Agosto, num treino, fez uma fissura no primeiro dedo do pé direito, que o levou a mais três semanas de paragem.
Pedro Emanuel
FC Porto
Outro que vai passar pela época sem jogar. A 12 de Agosto, no aquecimento para o jogo particular com o Manchester City, sofreu uma rotura total do tendão de aquiles do pé esquerdo. Quando parecia estar na fase final da recuperação começou a sentir dores e teve de voltar a ser operado, para debelar uma necrose parcial do tendão afectado. Vai passar o resto do campeonato em tratamento, para poder regressar em 2007/08.
Hugo
V. Setúbal
Começou por fazer uma distensão no adutor da perna direita, em jogo da Taça UEFA, com o Hereenveen, a 28 de Setembro. Regressou à competição já em Novembro mas, ao segundo jogo, frente ao Braga, no dia 27, fez uma entorse no joelho esquerdo que o afastou até ao Ano Novo. Ainda realizou mais um par de jogos até que, num treino, fez ontem uma semana, fracturou o menisco do joelho esquerdo. Talvez volte antes do fim da época.
Adalto
V. Setúbal
Regressou à competição no sábado passado, frente ao Boavista, cinco meses depois do último jogo, precisamente com o mesmo adversário. Tudo por causa de uma pubalgia que começou por o incomodar e que, por não estar a evoluir de forma satisfatória com repouso a que foi submetido, acabou por levá-lo a uma intervenção cirúrgica, já o mês de Outubro ia avançado.
Madrid
Sp. Braga
Em clima de euforia pela vitória contra o Benfica, dois dias antes, começou por fazer uma entorse na tibiotársica, a 20 de Novembro, e ficou de fora por mais de um mês. Em Janeiro, ainda foi a tempo de alinhar na dupla ronda da Taça, mas antes do regresso do campeonato, quando se falava numa transferência para o FC Porto, fez uma microrrotura muscular que está a revelar-se de difícil resolução.
Rui Costa
Benfica
Na estreia oficial pelo clube, na Luz contra o Áustria de Viena, contraiu uma rotura muscular de quatro milímetros. Saiu e parou quinze dias, até ao primeiro jogo do Benfica na Liga, no qual se ressentiu. Foi-lhe diagnosticado um edema e, três semanas depois, quando se julgava que o problema estava debelado, voltou a jogar. Agravou o que afinal era uma rotura muscular na coxa direita e teve de parar mais três meses. No domingo, teve de sair do confronto com o Nacional, mas a microrrotura na coxa direita não tem nada a ver com a lesão anterior e não o deve obrigar a muito mais que duas semanas de paragem.
Anderson
FC Porto
Um choque com o grego Katsouranis, no FC Porto-Benfica de 28 de Outubro, fracturou-lhe o perónio da perna direita e afectou-lhe alguns ligamentos na zona do tornozelo. Foi operado dois dias depois e os médicos avançaram com um período de paragem nunca inferior a três meses. E, três meses depois, no final de Janeiro, começou a trabalhar no ginásio. Segue-se o regresso aos relvados e espera-se que em Março volte a jogar.
Maciel
Sp. Braga
Lesionou-se logo num dos primeiros lances da deslocação a Setúbal, a 27 de Novembro. Fez um traumatismo do joelho direito e passou a treinar condicionado. A 14 de Dezembro, jogou com o Grasshopper e, apesar de ainda ser convocado para o jogo seguinte, percebeu que não estava bem. Teve de ser operado ao menisco antes do Natal e só na semana passada reiniciou a preparação no relvado.
Miccoli
Benfica
Tudo começou no excesso de peso: veio de férias e foi-lhe dado um plano de treinos específico para perder peso. Entrou em competição a 17 de Setembro e por lá esteve até 6 de Dezembro, quando fez uma microrrotura na coxa esquerda. Parou, voltou ao treino específico e defrontou a Académica, a 15 de Janeiro, mas só para se queixar de uma tendinite no joelho esquerdo que o afastou por mais três semanas. E já está de volta.
Hélder Barbosa
Académica
Emprestado pelo FC Porto, lesionou-se a 24 de Novembro, num choque durante um jogo-treino com o Pampilhosa. A rotura no tendão rotuliano da perna esquerda levou-o à mesa de operações e deve mantê-lo afastado da competição. Está a recuperar no centro de estágio portista, mas há a expectativa de, com sorte, poder alinhar nos últimos dois jogos da época, após um período de cinco meses de afastamento.
Outros candidatos ao onze
A selecção que se vê abaixo foi formada, posição a posição, pelos jogadores cujas lesões foram, ao mesmo tempo, mais duradouras e mediáticas. Outros podiam integrá-la, como Roma (Beira-Mar), Diakité (Beira-Mar), Fernando (Belenenses), Amaral (Belenenses) ou Mário Silva (Boavista). Ficam no banco.
Publicado em Correio da Manhã, 24/2/2007
Miguel Veloso e o risco
O momento em que, de bola nos pés à entrada do meio-campo adversário, Miguel Veloso levanta a cabeça e se decide pelo passe cruzado, a rasgar o campo, em direcção a Liedson, é definidor da qualidade de um jogador. Ali, ele podia esperar, segurar a bola para que os colegas (e os adversários também) se recolocassem melhor, podia entregar ao lado ou atrás, de forma a não se comprometer, podia fazer uma infinidade de coisas. Mas o que fez foi arriscar a descoberta imediata do caminho que levava ao golo. Teve prémio.
Momentos como este fizeram muita falta ao Sporting, especialmente enquanto João Moutinho e Nani atravessaram uma fase má da qual parecem estar agora a sair. Sem a capacidade dos seus dois dínamos para chegar depressa e com qualidade à frente, a equipa bem precisava de quem arriscasse um pouco nas transições ofensivas. E aqui perguntam os menos atentos: mas Miguel Veloso não é defesa ou médio-defensivo? É. Contudo, é a capacidade de esticar o jogo, de transformar acção defensiva em atacante que o torna único no plantel do Sporting. Defesa no campo, é um atacante na mentalidade e talvez seja isso mesmo que mais lhe tem inibido a afirmação numa equipa que privilegia os equilíbrios. Porque com Miguel Veloso em campo, sobretudo quando joga como médio-centro, as transições – especialidade deste Sporting – são muito mais imprevisíveis e difíceis de controlar.
Se com Custódio a médio-centro a equipa melhora o seu jogo posicional e as coberturas defensivas são mais eficazes e se com Moutinho naquela posição consegue aumentar o ritmo de forma segura, porque a circulação de bola é feita com mais intensidade mas menos risco, com Veloso ali, o jogo acelera ofensivamente. O preço a pagar é que também se perdem algumas referências no momento de reagrupar após a perda da bola. O próprio Paulo Bento referiu, após o jogo de Paços de Ferreira, que a equipa sofreu um golo pouco habitual, numa transição defensiva, a que não é alheia a contribuição do médio-centro. Se Veloso jogar como defesa-central, o problema tende a perder importância, mas tão atrás é raro ele ter a possibilidade de avançar em posse de bola enquanto há espaço convidativo para os seus passes largos no ataque: o tempo que ele demora a chegar a uma posição onde possa ser decisivo também serve para que os adversários se organizem.
A verdade é que basta olhar para os resultados para se perceber que há um Sporting com e outro sem Miguel Veloso. O primeiro é mais excitante, tem mais profundidade atacante e, apesar de ter sido submetido a provas mais duras – como quatro dos seis jogos da Liga dos Campeões – até ganha mais vezes: regista duas vitórias a cada três jogos e quase dois golos marcados por desafio. Sem o filho do ex-capitão do Benfica em campo, a equipa não ganha sequer metade dos jogos e pouco passa de um golo marcado por desafio. Miguel Veloso tem sido o melhor reforço de todos os que chegaram esta época ao Sporting, mas para aproveitar o seu futebol largo e arriscado é preciso querer fazê-lo.
SPORTING COM MIGUEL VELOSO
Nacional (f) 1-0 Médio-centro
Inter Milão (c) 1-0 Médio-centro
P. Ferreira (c) 0-1 Médio-centro
Aves (f) 2-0 Defesa central
Spartak (f) 1-1 Médio-centro
U. Leiria (c) 2-0 Médio-centro
Bayern Munique (c) 0-1 Médio-centro
Spartak (c) 1-3 Médio-centro
V. Setúbal (f) 3-0 Defesa central
Académica (c) 1-0 Defesa central
U. Madeira (f) 3-1 Defesa central
Rio Ave (c) 2-1 Defesa central
Nacional (c) 5-1 Médio-centro
Pinhalnovense (f) 6-0 Defesa central
P. Ferreira (f) 1-1 Médio-centro
Total: 15 jogos, 10 vitórias, 2 empates e 3 derrotas
66% de vitórias
SPORTING SEM MIGUEL VELOSO
Boavista (c) 3-2
E. Amadora (f) 1-0
FC Porto (c) 1-1
Beira Mar (f) 3-3
Sp. Braga (c) 3-0*
Bayern Munique (f) 0-0
Marítimo (f) 1-0
Inter (f) 0-1*
Naval (f) 1-0
Benfica (c) 0-2
Belenenses (f) 0-0*
Boavista (f) 1-1*
* Suplente utilizado
Total: 12 jogos, 5 vitórias, 5 empates e 2 derrotas
41% de vitórias
DÚVIDAS LEGÍTIMAS
O FC Porto pode eliminar o Chelsea?
Se, como é provável, José Mourinho ainda não tiver John Terry; se Jesualdo Ferreira não encolher a equipa como fez na visita ao Arsenal, em que abdicou da identidade atacante; se aumentar a agressividade na zona em frente aos centrais e se voltar a ter Quaresma em noite-sim, pode. São muitos ses, mas há horas de sorte.
O Barcelona desaprendeu de jogar?
Sem especular acerca do balneário, há um sinal evidente disso mesmo: a intensidade colocada em campo diminuiu desde a final de Paris. Não basta conhecer bem os rudimentos daquela forma de jogar, circular a bola a um-dois toques e disponibilizar sempre duas linhas de passe ao portador da bola. Há que fazê-lo com ritmo.
Em que é Miccoli diferente de Nuno Gomes?
Em tudo. Mas no que ao papel de ponta-de-lança diz respeito, embora ambos gostem de recuar para participar na movimentação colectiva, Nuno Gomes fá-lo sobretudo em busca de apoios laterais para uma tabela, enquanto Miccoli o faz com o fito numa desmarcação de ruptura, para aparecer de surpresa na frente a concluir.
PÉ DE PÁGINA
PROFISSIONAL. No Barcelona-Liverpool, há um momento revelador. Num livre indirecto dentro da área de Valdês, Puyol não saiu de frente da bola até que o árbitro lhe disse, não uma mas duas vezes, que a bola só podia ser movimentada após o silvar do apito. Depois do que acontecera na véspera, um golo “à traição” marcado por Ryan Giggs ao Lille, o capitão do Barca estava a ser profissional, a justificar o que lhe pagam.
FAIR-PLAY. Num Mundo perfeito, haveria “fair-play” e tal não seria necessário. Mas no Mundo em que vivemos, um Mundo concorrencial, em que a arte do engano nem sempre é devidamente punida, quem tem razão é Jorge Jesus: o “fair-play” é mesmo uma treta. Quanto mais não seja porque não está na lei (se estivesse não era “fair-play” mas sim legalidade) e porque quem manda permite que ele seja ignorado de forma sistemática.
INGENUIDADE. É por isto que não condeno as equipas que não deitam a bola para fora quando há um adversário por terra. Se for grave, o árbitro deve interromper; se não for, o jogador que saia pelo próprio pé. O que não pode suceder é uma equipa abusar das ingenuidades alheias, cortar uma situação de perigo ao adversário com uma lesão e, a seguir, devolver-lhe a bola para perto da baliza, onde nem se coíbe de pressionar.
Publicado em Record Dez, 24/2/2007
Momentos como este fizeram muita falta ao Sporting, especialmente enquanto João Moutinho e Nani atravessaram uma fase má da qual parecem estar agora a sair. Sem a capacidade dos seus dois dínamos para chegar depressa e com qualidade à frente, a equipa bem precisava de quem arriscasse um pouco nas transições ofensivas. E aqui perguntam os menos atentos: mas Miguel Veloso não é defesa ou médio-defensivo? É. Contudo, é a capacidade de esticar o jogo, de transformar acção defensiva em atacante que o torna único no plantel do Sporting. Defesa no campo, é um atacante na mentalidade e talvez seja isso mesmo que mais lhe tem inibido a afirmação numa equipa que privilegia os equilíbrios. Porque com Miguel Veloso em campo, sobretudo quando joga como médio-centro, as transições – especialidade deste Sporting – são muito mais imprevisíveis e difíceis de controlar.
Se com Custódio a médio-centro a equipa melhora o seu jogo posicional e as coberturas defensivas são mais eficazes e se com Moutinho naquela posição consegue aumentar o ritmo de forma segura, porque a circulação de bola é feita com mais intensidade mas menos risco, com Veloso ali, o jogo acelera ofensivamente. O preço a pagar é que também se perdem algumas referências no momento de reagrupar após a perda da bola. O próprio Paulo Bento referiu, após o jogo de Paços de Ferreira, que a equipa sofreu um golo pouco habitual, numa transição defensiva, a que não é alheia a contribuição do médio-centro. Se Veloso jogar como defesa-central, o problema tende a perder importância, mas tão atrás é raro ele ter a possibilidade de avançar em posse de bola enquanto há espaço convidativo para os seus passes largos no ataque: o tempo que ele demora a chegar a uma posição onde possa ser decisivo também serve para que os adversários se organizem.
A verdade é que basta olhar para os resultados para se perceber que há um Sporting com e outro sem Miguel Veloso. O primeiro é mais excitante, tem mais profundidade atacante e, apesar de ter sido submetido a provas mais duras – como quatro dos seis jogos da Liga dos Campeões – até ganha mais vezes: regista duas vitórias a cada três jogos e quase dois golos marcados por desafio. Sem o filho do ex-capitão do Benfica em campo, a equipa não ganha sequer metade dos jogos e pouco passa de um golo marcado por desafio. Miguel Veloso tem sido o melhor reforço de todos os que chegaram esta época ao Sporting, mas para aproveitar o seu futebol largo e arriscado é preciso querer fazê-lo.
SPORTING COM MIGUEL VELOSO
Nacional (f) 1-0 Médio-centro
Inter Milão (c) 1-0 Médio-centro
P. Ferreira (c) 0-1 Médio-centro
Aves (f) 2-0 Defesa central
Spartak (f) 1-1 Médio-centro
U. Leiria (c) 2-0 Médio-centro
Bayern Munique (c) 0-1 Médio-centro
Spartak (c) 1-3 Médio-centro
V. Setúbal (f) 3-0 Defesa central
Académica (c) 1-0 Defesa central
U. Madeira (f) 3-1 Defesa central
Rio Ave (c) 2-1 Defesa central
Nacional (c) 5-1 Médio-centro
Pinhalnovense (f) 6-0 Defesa central
P. Ferreira (f) 1-1 Médio-centro
Total: 15 jogos, 10 vitórias, 2 empates e 3 derrotas
66% de vitórias
SPORTING SEM MIGUEL VELOSO
Boavista (c) 3-2
E. Amadora (f) 1-0
FC Porto (c) 1-1
Beira Mar (f) 3-3
Sp. Braga (c) 3-0*
Bayern Munique (f) 0-0
Marítimo (f) 1-0
Inter (f) 0-1*
Naval (f) 1-0
Benfica (c) 0-2
Belenenses (f) 0-0*
Boavista (f) 1-1*
* Suplente utilizado
Total: 12 jogos, 5 vitórias, 5 empates e 2 derrotas
41% de vitórias
DÚVIDAS LEGÍTIMAS
O FC Porto pode eliminar o Chelsea?
Se, como é provável, José Mourinho ainda não tiver John Terry; se Jesualdo Ferreira não encolher a equipa como fez na visita ao Arsenal, em que abdicou da identidade atacante; se aumentar a agressividade na zona em frente aos centrais e se voltar a ter Quaresma em noite-sim, pode. São muitos ses, mas há horas de sorte.
O Barcelona desaprendeu de jogar?
Sem especular acerca do balneário, há um sinal evidente disso mesmo: a intensidade colocada em campo diminuiu desde a final de Paris. Não basta conhecer bem os rudimentos daquela forma de jogar, circular a bola a um-dois toques e disponibilizar sempre duas linhas de passe ao portador da bola. Há que fazê-lo com ritmo.
Em que é Miccoli diferente de Nuno Gomes?
Em tudo. Mas no que ao papel de ponta-de-lança diz respeito, embora ambos gostem de recuar para participar na movimentação colectiva, Nuno Gomes fá-lo sobretudo em busca de apoios laterais para uma tabela, enquanto Miccoli o faz com o fito numa desmarcação de ruptura, para aparecer de surpresa na frente a concluir.
PÉ DE PÁGINA
PROFISSIONAL. No Barcelona-Liverpool, há um momento revelador. Num livre indirecto dentro da área de Valdês, Puyol não saiu de frente da bola até que o árbitro lhe disse, não uma mas duas vezes, que a bola só podia ser movimentada após o silvar do apito. Depois do que acontecera na véspera, um golo “à traição” marcado por Ryan Giggs ao Lille, o capitão do Barca estava a ser profissional, a justificar o que lhe pagam.
FAIR-PLAY. Num Mundo perfeito, haveria “fair-play” e tal não seria necessário. Mas no Mundo em que vivemos, um Mundo concorrencial, em que a arte do engano nem sempre é devidamente punida, quem tem razão é Jorge Jesus: o “fair-play” é mesmo uma treta. Quanto mais não seja porque não está na lei (se estivesse não era “fair-play” mas sim legalidade) e porque quem manda permite que ele seja ignorado de forma sistemática.
INGENUIDADE. É por isto que não condeno as equipas que não deitam a bola para fora quando há um adversário por terra. Se for grave, o árbitro deve interromper; se não for, o jogador que saia pelo próprio pé. O que não pode suceder é uma equipa abusar das ingenuidades alheias, cortar uma situação de perigo ao adversário com uma lesão e, a seguir, devolver-lhe a bola para perto da baliza, onde nem se coíbe de pressionar.
Publicado em Record Dez, 24/2/2007
Nacional - Paixão pela esquerda
O Nacional foi, contra o Benfica, uma equipa que procurou privilegiar a segurança na troca de bola. Só assim se explica a elevada percentagem de passes certos feitos num jogo em que poucas ocasiões de golo criou. Alonso, o elemento mais em jogo de toda a equipa, protagonizou 102 intervenções, deixando adivinhar a propensão da equipa para se inclinar para a esquerda. Uma propensão que lhe custou, entre outras coisas, a rara actividade de Bruno e Bruno Amaro, quase dois pesos-mortos na construção ofensiva e por isso mesmo substituídos.
Defensivamente, Carlos Brito não cometeu o erro que seria mandar o seu médio mais recuado seguir o segundo ponta-de-lança adversário, atribuindo essa tarefa a Patacas, lateral-direito que foi apanhado frequentemente a fechar ao meio: só oito das suas 24 intervenções defensivas (22 recuperações e duas faltas) ocorreram na faixa lateral. Enquanto a equipa teve fôlego para se manter junta, a estratégia deu bons frutos e o jogo manteve-se num impasse. Só que, à medida que o tempo foi avançado, Alonso perdeu fulgor (só 13 das 50 intervenções no meio-campo adversário ocorreram nos últimos 30 minutos de jogo), os dois centrais foram engolidos pelo pressing interior do Benfica e deixaram de participar na construção de jogo (nos 16 minutos entre o intervalo e o golo do Benfica Ávalos só tocou na bola três vezes sem ser para defender e Ricardo Fernandes duas) deixando o meio-campo abandonado numa vastidão de terreno onde não era possível conjugar futebol apoiado com busca de profundidade.
Porque o maior pecado no futebol do Nacional foi sempre a falta de profundidade. Benaglio fez algumas saídas de bola curtas, mas quase sempre apostava na bola longa, para Rodrigo ou Diego, também quase sempre perdida. Como o meio-campo não esteve bem nas recuperações (Chainho fez 20, mas só uma no meio-campo ofensivo, enquanto Bruno somou apenas uma, Bruno Amaro sete e Juliano quatro), a equipa só recomeçava a jogar muito atrás. E aí a solução passava por entregar a bola a Alonso, para este invariavelmente combinar com Juliano e a levar até Rodrigo. Meia equipa ficava ostracizada.
JULIANO
Escolhe o lado
Alonso foi o homem mais em jogo do Nacional, mas foi Juliano o mais influente. Começou o jogo como médio-esquerdo e foi o ponto de apoio para as triangulações que permitiam o avanço ao lateral desse lado. Na segunda parte, quando a equipa se colocou em 4x3x3, variou para a direita e foi finalmente possível ver Patacas atacar (37 das 78 intervenções do lateral-direito ocorreram após os 61’ de jogo, 13 das quais no meio-campo do Benfica). Além disso, Juliano fez o mais perigoso remate do Nacional e assistiu os colegas para seis das dez restantes tentativas que a equipa fez à baliza de Quim. Não foi por ele que o Nacional não chegou lá.
CHAINHO
Distribuidor democrático
Chainho não fez um jogo brilhante, mas mostrou que domina como poucos a ocupação dos espaços à frente da defesa e a escolha de rotas para a primeira fase de construção ofensiva. Foi um dos principais recuperadores de bolas (com 20, só batido pelas 24 de Ávalos e pelas 22 de Patacas) e apareceu como apoio frequente para os recuperadores (foi o destino de um terço das recuperações completas do quarteto defensivo). Além disso, foi democrático na distribuição de jogo, no que escolheu preferencialmente os laterais: oito passes para Alonso, seis para Patacas, mas também seis para Diego, cinco para Bruno, Juliano e Rogerinho, quatro para Ávalos e Bruno Amaro.
Publicado em Record, 21/2/2007
Defensivamente, Carlos Brito não cometeu o erro que seria mandar o seu médio mais recuado seguir o segundo ponta-de-lança adversário, atribuindo essa tarefa a Patacas, lateral-direito que foi apanhado frequentemente a fechar ao meio: só oito das suas 24 intervenções defensivas (22 recuperações e duas faltas) ocorreram na faixa lateral. Enquanto a equipa teve fôlego para se manter junta, a estratégia deu bons frutos e o jogo manteve-se num impasse. Só que, à medida que o tempo foi avançado, Alonso perdeu fulgor (só 13 das 50 intervenções no meio-campo adversário ocorreram nos últimos 30 minutos de jogo), os dois centrais foram engolidos pelo pressing interior do Benfica e deixaram de participar na construção de jogo (nos 16 minutos entre o intervalo e o golo do Benfica Ávalos só tocou na bola três vezes sem ser para defender e Ricardo Fernandes duas) deixando o meio-campo abandonado numa vastidão de terreno onde não era possível conjugar futebol apoiado com busca de profundidade.
Porque o maior pecado no futebol do Nacional foi sempre a falta de profundidade. Benaglio fez algumas saídas de bola curtas, mas quase sempre apostava na bola longa, para Rodrigo ou Diego, também quase sempre perdida. Como o meio-campo não esteve bem nas recuperações (Chainho fez 20, mas só uma no meio-campo ofensivo, enquanto Bruno somou apenas uma, Bruno Amaro sete e Juliano quatro), a equipa só recomeçava a jogar muito atrás. E aí a solução passava por entregar a bola a Alonso, para este invariavelmente combinar com Juliano e a levar até Rodrigo. Meia equipa ficava ostracizada.
JULIANO
Escolhe o lado
Alonso foi o homem mais em jogo do Nacional, mas foi Juliano o mais influente. Começou o jogo como médio-esquerdo e foi o ponto de apoio para as triangulações que permitiam o avanço ao lateral desse lado. Na segunda parte, quando a equipa se colocou em 4x3x3, variou para a direita e foi finalmente possível ver Patacas atacar (37 das 78 intervenções do lateral-direito ocorreram após os 61’ de jogo, 13 das quais no meio-campo do Benfica). Além disso, Juliano fez o mais perigoso remate do Nacional e assistiu os colegas para seis das dez restantes tentativas que a equipa fez à baliza de Quim. Não foi por ele que o Nacional não chegou lá.
CHAINHO
Distribuidor democrático
Chainho não fez um jogo brilhante, mas mostrou que domina como poucos a ocupação dos espaços à frente da defesa e a escolha de rotas para a primeira fase de construção ofensiva. Foi um dos principais recuperadores de bolas (com 20, só batido pelas 24 de Ávalos e pelas 22 de Patacas) e apareceu como apoio frequente para os recuperadores (foi o destino de um terço das recuperações completas do quarteto defensivo). Além disso, foi democrático na distribuição de jogo, no que escolheu preferencialmente os laterais: oito passes para Alonso, seis para Patacas, mas também seis para Diego, cinco para Bruno, Juliano e Rogerinho, quatro para Ávalos e Bruno Amaro.
Publicado em Record, 21/2/2007
A falta que fazem as telenovelas
Em Barcelona, vive-se uma variante da era dos galácticos que mais parece uma novela mexicana. A vertiginosa descrição dos últimos acontecimentos bem podia figurar num daqueles resumos que as revistas de especialidade publicam antes de os episódios irem para o ar. Eto’o recusa-se a entrar por uns minutos num jogo; Rijkaard chateia-se e expõe a situação em público, fora do balneário; Ronaldinho intervém e manda recado a Eto’o, dizendo que ele tem de pensar mais no grupo; Eto’o zanga-se com Ronaldinho e com Rijkaard; Thiago Motta pede a Eto’o e Ronaldinho para se abraçarem frente aos fotógrafos, mas Deco não fica convencido; Rijkaard anuncia que afinal de contas não se vai embora do clube no final da época conforme todos esperavam, e fá-lo antes de um jogo importante, em Valência; Deco é expulso nesse jogo e a equipa perde, deixando-se igualar pelo Sevilha no topo da tabela. Uff! Tudo isto aconteceu numa semana.
Em Madrid, embora mais espalhado no tempo, o drama é semelhante. Capello chega para acabar com a boa vida dos galácticos; o mau futebol da equipa começa por lhe tirar margem de manobra, mas são os maus resultados que o deixam em sérias dificuldades; Beckham decide romper com a paz podre e anuncia que vai viver para Los Angeles com a sua “Spice”; o treinador mete-o de castigo; Cassano é apanhado a dizer mal do treinador por uma câmara oculta e o treinador também o mete de castigo; os resultados não melhoram e o treinador perdoa Beckham, que no entanto é expulso de forma infame em mais um jogo decepcionante; fala-se também no perdão a Cassano, mas uma rádio surpreende ao dizer que o treinador se demitiu imediatamente antes de um jogo da Liga dos Campeões; o clube desmente. E, já depois de eu escrever, toda a gente terá ido ao Bernabéu, quanto mais não seja para ver se Capello se senta no banco ou não.
Em Itália, arrumada a questão da corrupção com a brevidade que se impunha, discutem-se os golos de Ronaldo. Se olharmos para Inglaterra, ficamos a saber que Cristiano Ronaldo passou a fazer parte do lote dos jogadores mais mediáticos do Mundo, onde já estava Rooney, ou que os futebolistas do Liverpool armaram confusão no estágio no Algarve, portando-se como “hooligans”. O Chelsea destoa, porque o que anda nas notícias é o enésimo exercício anual fechado com prejuízo (desta vez superior a 100 milhões de euros) pelo clube no qual Abramovich não se importa de perder uns trocos da sua fortuna pessoal. Mas até isso tem o seu charme.
Em Portugal, as notícias de desporto têm a ver com o passaporte de José Veiga ou o que ele vai fazer quando o juiz lho devolver, com os contratos paralelos que este acusa a administração do Sporting de fazer ou os avanços da investigação do “Apito Dourado”. Há quem diga que isto não é notícia ou pelo menos aja em conformidade. Discordo. É notícia e de grande importância. Deveria era resolver-se rapidamente para que o palco fosse de novo ocupado por quem, até nos desvarios tele-novelescos, ajuda a encher os estádios.
Publicado em Sábado, 21/2/2007
Em Madrid, embora mais espalhado no tempo, o drama é semelhante. Capello chega para acabar com a boa vida dos galácticos; o mau futebol da equipa começa por lhe tirar margem de manobra, mas são os maus resultados que o deixam em sérias dificuldades; Beckham decide romper com a paz podre e anuncia que vai viver para Los Angeles com a sua “Spice”; o treinador mete-o de castigo; Cassano é apanhado a dizer mal do treinador por uma câmara oculta e o treinador também o mete de castigo; os resultados não melhoram e o treinador perdoa Beckham, que no entanto é expulso de forma infame em mais um jogo decepcionante; fala-se também no perdão a Cassano, mas uma rádio surpreende ao dizer que o treinador se demitiu imediatamente antes de um jogo da Liga dos Campeões; o clube desmente. E, já depois de eu escrever, toda a gente terá ido ao Bernabéu, quanto mais não seja para ver se Capello se senta no banco ou não.
Em Itália, arrumada a questão da corrupção com a brevidade que se impunha, discutem-se os golos de Ronaldo. Se olharmos para Inglaterra, ficamos a saber que Cristiano Ronaldo passou a fazer parte do lote dos jogadores mais mediáticos do Mundo, onde já estava Rooney, ou que os futebolistas do Liverpool armaram confusão no estágio no Algarve, portando-se como “hooligans”. O Chelsea destoa, porque o que anda nas notícias é o enésimo exercício anual fechado com prejuízo (desta vez superior a 100 milhões de euros) pelo clube no qual Abramovich não se importa de perder uns trocos da sua fortuna pessoal. Mas até isso tem o seu charme.
Em Portugal, as notícias de desporto têm a ver com o passaporte de José Veiga ou o que ele vai fazer quando o juiz lho devolver, com os contratos paralelos que este acusa a administração do Sporting de fazer ou os avanços da investigação do “Apito Dourado”. Há quem diga que isto não é notícia ou pelo menos aja em conformidade. Discordo. É notícia e de grande importância. Deveria era resolver-se rapidamente para que o palco fosse de novo ocupado por quem, até nos desvarios tele-novelescos, ajuda a encher os estádios.
Publicado em Sábado, 21/2/2007
Miccoli - A matrona de Fellini
Ao vê-lo correr meio campo com a bola sem que ninguém o apanhasse, bamboleando o excesso de anca para a esquerda e para a direita e deixando subentendidas as gorduras debaixo da camisola, a imagem que me vem à memória é a de uma matrona de Federico Fellini. Tal como as personagens femininas do mestre de Rimini, Miccoli, o avançado intermitente, é excessivo em tudo. A começar no peso, que toda a gente ficou a saber, pela boca do treinador, estar uns quilos acima do ideal. Mas é-o também nas reacções, a mostrar pelo na venta primeiro, mas a provar em campo depois. Mesmo gordo, a verdade é que foi o mais rápido a chegar a dois ressaltos na área, que transformou em dois golos decisivos, primeiro contra o Dínamo de Bucareste e depois na Choupana, com o Nacional. Mesmo gordo, fez sem ser apanhado os 40 metros que separam a saída do seu meio-campo e a marca de penalti e, face ao elegante Benaglio, meteu-lhe a bola entre a cabeça e a mão. No primeiro caso, compensou o excesso de peso com sentido posicional; no segundo com uma vontade tão exagerada como o movimento do ponteiro da balança sempre que o acciona. Miccoli pode estar pesado, mas não perdeu peso específico na equipa.
Publicado em Correio da Manhã, 20/2/2007
Publicado em Correio da Manhã, 20/2/2007
sexta-feira, 23 de fevereiro de 2007
'Donkey' sets his sights on giving old rival a kicking
Jesualdo Ferreira says he does not bear grudges but the mild-mannered Porto manager could be forgiven for approaching tonight's game against Chelsea with a strong desire to embarrass Jose Mourinho.
Their paths have crossed frequently since Ferreira was a teacher and Mourinho a student at the Lisbon Superior Institute for Physical Education in the early 80s, but never with so much at stake.
There is no record of animosity at the institute or when Mourinho, then a fitness coach, left Estrela da Amadora in 1991 after Ferreira was appointed manager. But their relationship suffered a potentially irreparable blow in 2002 when Ferreira agreed to become Mourinho's assistant at Benfica only to find the young manager did not want to work with him. Mourinho felt so strongly that he refused Benfica's offer and later joined Porto.
Both men seem to have been walking around with chips on their shoulders and matters deteriorated in February 2005 when Mourinho wrote in his then weekly column for the Portuguese magazine Record Dez: "One is a coach with a 30-year career, the other with a three-year one. The one with 30 years has never won anything; the one with three years has won a lot. The one who has coached for 30 years has an enormous career; the one with three years has a small career. The one with a 30-year career will be forgotten when he ends it; the one with three could end it right now and he could never be erased from history. This could be the story of a donkey who worked for 30 years but never became a horse."
Mourinho did not mention names but it seemed obvious he was referring to himself, then at Chelsea, and Ferreira, whose Sporting Braga had lost top spot in the Portuguese league that week after an unexpected defeat in the Minho derby against Vitoria Guimaraes.
In his 2003 autobiography Mourinho gave this explanation for his decision to reject the chance to rejoin Benfica, where he had been briefly in charge in 2000, when the club insisted that Ferreira remain part of the coaching team: "My ideas about the coaching staff were well defined. Baltemar Brito and Rui Faria would definitely come with me from Leiria. "[The goalkeepers' coach] would be replaced and I also wanted to work with [my former assistant at Benfica] Carlos Mozer again. So I could not find a place to fit Jesualdo Ferreira."
Manuel Vilarinho, the president at Benfica at the time, vividly remembers the meetings he had with Mourinho during that time and said this week: "We met twice and in both meetings we failed to reach an agreement because of Mourinho's unwillingness to accept Jesualdo Ferreira as his assistant. In the second meeting he told me: 'And what if in a training session I have to use the F-word? I would be ashamed of saying it in front of the professor.'
"But of course that was only an excuse. He just did not want to work with Jesualdo Ferreira but I felt we could not let Jesualdo go again. To me, people come first and I don't regret it."
Ferreira has been a coach since his 28th birthday when he took the Portugal under-17 team at the St Malo tournament and has divided his career between the Portuguese Football Association, including with the under-21s, and clubs such as Academica, Torreense, Estrela, Alverca, Benfica, Braga and Porto.
The 60-year-old has faced Mourinho six times and never won, suffering five defeats. Even the draw while at Braga would have given him little satisfaction. It came three days after Porto had beaten Celtic in the 2003 Uefa Cup final and Mourinho, having already won the league, sent out a reserve team.
The second meeting between the managers must hurt Ferreira most. The game has become part of the Mourinho myth, his half-time talk seen to have inspired Porto from almost certain defeat to victory at Ferreira's Benfica.
Porto had just had their captain, Jorge Costa, sent off but Mourinho told his players: "I have two things to say to you. The first one is that we are going to win this match. And the second is that, as we speak, they are shitting in their pants. And, as they will not come out to beat us, we will have to go and force the attack." Porto won 2-1 and the perception that Mourinho is a great motivator and Ferreira a dour tactician has endured.
Ferreira did not complete a full season in the top division until he was 54. Before that he was often ridiculed for his theoretical approach and nicknamed Professor Pardal after a cartoon inventor whose inventions rarely worked. Tonight, in his first meeting with Mourinho since 2004, Ferreira hopes his ideas will come together on the biggest stage of all.
Publicado em The Guardian, 21/2/2007
Their paths have crossed frequently since Ferreira was a teacher and Mourinho a student at the Lisbon Superior Institute for Physical Education in the early 80s, but never with so much at stake.
There is no record of animosity at the institute or when Mourinho, then a fitness coach, left Estrela da Amadora in 1991 after Ferreira was appointed manager. But their relationship suffered a potentially irreparable blow in 2002 when Ferreira agreed to become Mourinho's assistant at Benfica only to find the young manager did not want to work with him. Mourinho felt so strongly that he refused Benfica's offer and later joined Porto.
Both men seem to have been walking around with chips on their shoulders and matters deteriorated in February 2005 when Mourinho wrote in his then weekly column for the Portuguese magazine Record Dez: "One is a coach with a 30-year career, the other with a three-year one. The one with 30 years has never won anything; the one with three years has won a lot. The one who has coached for 30 years has an enormous career; the one with three years has a small career. The one with a 30-year career will be forgotten when he ends it; the one with three could end it right now and he could never be erased from history. This could be the story of a donkey who worked for 30 years but never became a horse."
Mourinho did not mention names but it seemed obvious he was referring to himself, then at Chelsea, and Ferreira, whose Sporting Braga had lost top spot in the Portuguese league that week after an unexpected defeat in the Minho derby against Vitoria Guimaraes.
In his 2003 autobiography Mourinho gave this explanation for his decision to reject the chance to rejoin Benfica, where he had been briefly in charge in 2000, when the club insisted that Ferreira remain part of the coaching team: "My ideas about the coaching staff were well defined. Baltemar Brito and Rui Faria would definitely come with me from Leiria. "[The goalkeepers' coach] would be replaced and I also wanted to work with [my former assistant at Benfica] Carlos Mozer again. So I could not find a place to fit Jesualdo Ferreira."
Manuel Vilarinho, the president at Benfica at the time, vividly remembers the meetings he had with Mourinho during that time and said this week: "We met twice and in both meetings we failed to reach an agreement because of Mourinho's unwillingness to accept Jesualdo Ferreira as his assistant. In the second meeting he told me: 'And what if in a training session I have to use the F-word? I would be ashamed of saying it in front of the professor.'
"But of course that was only an excuse. He just did not want to work with Jesualdo Ferreira but I felt we could not let Jesualdo go again. To me, people come first and I don't regret it."
Ferreira has been a coach since his 28th birthday when he took the Portugal under-17 team at the St Malo tournament and has divided his career between the Portuguese Football Association, including with the under-21s, and clubs such as Academica, Torreense, Estrela, Alverca, Benfica, Braga and Porto.
The 60-year-old has faced Mourinho six times and never won, suffering five defeats. Even the draw while at Braga would have given him little satisfaction. It came three days after Porto had beaten Celtic in the 2003 Uefa Cup final and Mourinho, having already won the league, sent out a reserve team.
The second meeting between the managers must hurt Ferreira most. The game has become part of the Mourinho myth, his half-time talk seen to have inspired Porto from almost certain defeat to victory at Ferreira's Benfica.
Porto had just had their captain, Jorge Costa, sent off but Mourinho told his players: "I have two things to say to you. The first one is that we are going to win this match. And the second is that, as we speak, they are shitting in their pants. And, as they will not come out to beat us, we will have to go and force the attack." Porto won 2-1 and the perception that Mourinho is a great motivator and Ferreira a dour tactician has endured.
Ferreira did not complete a full season in the top division until he was 54. Before that he was often ridiculed for his theoretical approach and nicknamed Professor Pardal after a cartoon inventor whose inventions rarely worked. Tonight, in his first meeting with Mourinho since 2004, Ferreira hopes his ideas will come together on the biggest stage of all.
Publicado em The Guardian, 21/2/2007
Gerrard - Um anjo francês
Quando chegou à equipa principal do Liverpool, Steven Gerrard teve que passar por um ritual de iniciação. “Obrigaram-me a cantar o ‘Angels’, do Robbie Williams”, revelou depois, já uma estrela formada. “Todos os novos têm que fazer alguma coisa desse género. Se não formos bons, mandam-nos cerveja”. Gerrard não foi bom nem mau: ainda houve quem o molhasse. Afinal, fez na música o que se esperava dele em campo até ao momento em que deixou o juízo em França e deu um salto de qualidade como futebolista.
Se há um momento fundador na passagem de Gerrard para o estrelato é o dia em que tirou os quatro dentes do siso, a conselho de um médico francês. Até então, não era capaz de fazer dois jogos por semana, debatia-se com lesões frequentes que o afastavam dos grandes desafios. Gerard Houllier, o ex-seleccionador francês que por esses tempos era treinador do Liverpool, mandou-o a Phillippe Boixel, um osteopata que conhecia da selecção e que diagnosticou ao jovem médio problemas relacionados com a rapidez no crescimento. Até aos 14 anos, altura em que foi recusado em Lilleshall – a escola federativa para os futebolistas mais promissores do país – Steven Gerrard era da mesma altura que Michael Owen, seu companheiro do Liverpool, que entrou. Hoje tem mais 13 centímetros.
Ao contrário de Owen, contudo, Gerrard manteve-se fiel ao Liverpool. Mas a ligação teve os seus altos e baixos. Insignificantes, como os motivados pelas experiências a que o jovem se submeteu nos dois clubes de Manchester e no Everton, mas também importantes, como a incerteza acerca do novo contrato que se seguiu à vitória na Liga dos Campeões, em 2005. Com dois anos por cumprir, Gerrard interessava ao Chelsea e queria ganhar mais. O Liverpool fez-lhe uma oferta de que o já capitão de equipa não gostou e, a 5 de Julho, Gerrard disse publicamente que ia sair. Terramoto: os adeptos queimaram-lhe camisolas, há quem diga que um gangster das docas lhe apontou uma arma para o forçar a renovar. Algo que Gerrard desmente. Mas, três dias depois, o contrato estava renovado.
Gerrard chegara ao Liverpool com nove anos, depois de uma curta experiência no Whiston Juniors, a equipa do bairro. Ainda criança, um acidente com uma forquilha quase lhe custou um dedo do pé e o sonho de um dia ser como John Barnes, seu ídolo de meninice. A primeira desilusão da careira – a recusa em Lilleshall – não o fez desistir, mas abrandou-lhe a pressa de viver: entre os 14 e os 16 anos fez apenas 20 jogos, sinal de irregularidade que continuou a afectá-lo quando chegou à primeira equipa (em Novembro de 1998) e à selecção (em 2000). Até ao momento em que um anjo francês lhe tirou os sisos. Como é que diz a canção? “Para onde quer que vá, sei que a vida não me quebrará”. Pois foi isso mesmo.
Publicado em Correio da Manhã, 17/2/2007
Se há um momento fundador na passagem de Gerrard para o estrelato é o dia em que tirou os quatro dentes do siso, a conselho de um médico francês. Até então, não era capaz de fazer dois jogos por semana, debatia-se com lesões frequentes que o afastavam dos grandes desafios. Gerard Houllier, o ex-seleccionador francês que por esses tempos era treinador do Liverpool, mandou-o a Phillippe Boixel, um osteopata que conhecia da selecção e que diagnosticou ao jovem médio problemas relacionados com a rapidez no crescimento. Até aos 14 anos, altura em que foi recusado em Lilleshall – a escola federativa para os futebolistas mais promissores do país – Steven Gerrard era da mesma altura que Michael Owen, seu companheiro do Liverpool, que entrou. Hoje tem mais 13 centímetros.
Ao contrário de Owen, contudo, Gerrard manteve-se fiel ao Liverpool. Mas a ligação teve os seus altos e baixos. Insignificantes, como os motivados pelas experiências a que o jovem se submeteu nos dois clubes de Manchester e no Everton, mas também importantes, como a incerteza acerca do novo contrato que se seguiu à vitória na Liga dos Campeões, em 2005. Com dois anos por cumprir, Gerrard interessava ao Chelsea e queria ganhar mais. O Liverpool fez-lhe uma oferta de que o já capitão de equipa não gostou e, a 5 de Julho, Gerrard disse publicamente que ia sair. Terramoto: os adeptos queimaram-lhe camisolas, há quem diga que um gangster das docas lhe apontou uma arma para o forçar a renovar. Algo que Gerrard desmente. Mas, três dias depois, o contrato estava renovado.
Gerrard chegara ao Liverpool com nove anos, depois de uma curta experiência no Whiston Juniors, a equipa do bairro. Ainda criança, um acidente com uma forquilha quase lhe custou um dedo do pé e o sonho de um dia ser como John Barnes, seu ídolo de meninice. A primeira desilusão da careira – a recusa em Lilleshall – não o fez desistir, mas abrandou-lhe a pressa de viver: entre os 14 e os 16 anos fez apenas 20 jogos, sinal de irregularidade que continuou a afectá-lo quando chegou à primeira equipa (em Novembro de 1998) e à selecção (em 2000). Até ao momento em que um anjo francês lhe tirou os sisos. Como é que diz a canção? “Para onde quer que vá, sei que a vida não me quebrará”. Pois foi isso mesmo.
Publicado em Correio da Manhã, 17/2/2007
Portugal abre portas ao capital
Filipe Soares Franco nem pode ser acusado de estar a fazer a coisa pela calada: no manifesto eleitoral que apresentou aos sócios e que mereceu a aprovação de 74 por centos dos votantes nas eleições de Abril passado, lá estava a “promessa” de “alienação de parte do capital social da SAD” como forma de diminuir o passivo. Agora, contudo, o presidente leonino vai mais longe. Na altura dizia que o clube não ia abdicar da posição maioritária – clube e SGPS somados têm neste momento 78 por cento do capital –, mas o “Sport” sabe que apenas o fez para não chocar logo de entrada, pois essa era já a sua ideia. O anúncio feito este mês ao “Público” – “o Sporting tem de ter a gestão, mas não precisa de ter a maioria na SAD” – serviu para testar as reacções de sócios e oposição, mas expressa com fidelidade aquela que sempre foi a vontade do presidente, desde que aceitou uma comissão de serviço como mero substituto de António Dias da Cunha.
Na base desta ideia do presidente do Sporting está a noção de que quem investe vai querer ter uma palavra a dizer na forma como o clube é gerido. Nada de estranho nem ameaçador, pois ninguém quererá meter milhões num clube de futebol para os perder com uma gestão ruinosa: se o faz é, de certeza, para ganhar. É essa a experiência que, após ondas de choque geradas no momento em que os maiores clubes ingleses começaram a ser adquiridos por multi-milionários estrangeiros, se vive neste momento em Inglaterra: o Manchester United caminha calmamente sob o domínio dos novos donos americanos, na frente do campeonato; os adeptos do Chelsea adoram Abramovich e o rol de títulos que ele trouxe para o clube com a sua lógica despesista e no Villa Park até já se entoam cânticos de apoio a Randy Lerner, o americano que comprou o clube ao velho Doug Ellis.
A questão é que – talvez com excepção de Roman Abramovich – todos os compradores de clubes ingleses entraram no negócio para ganhar dinheiro. E por isso escolheram um mercado que o proporciona, como o inglês. Oito dos 20 clubes mundiais que mais receita geraram no último ano jogam na Premier League. Na lista, elaborada pela Delloitte, aparece apenas um clube português, o Benfica, em 20º lugar. Um dado deprimente para os que entram numa Liga cujo melhor marcador, o camaronês Meyong, se transferiu do Belenenses para o modesto Levante, de Espanha, onde raramente é utilizado mas de onde ninguém consegue fazê-lo regressar, porque em Portugal os valores pagos são muito menores, ao nível da II Liga espanhola. A constatação desta realidade já levou dirigentes de SAD portuguesas, como o Belenenses, o Marítimo ou o Vitória de Setúbal, a admitir ceder o controlo maioritário a investidores que permitam concorrer com os clubes das Ligas que geram maiores receitas.
O risco da abertura do cofre a esses investidores, contudo, é maior do que parece – não por uma questão de perda de identidade ou de sujeição a uma qualquer OPA hostil, mas porque pode repetir-se o fenómeno-Farense (ver caixa). Claro que as coisas não têm necessariamente de correr mal, mas este é um fantasma com o qual os presidentes das SAD portuguesas terão de debater-se antes de verem os sócios aprovar a desblindagem do capital que, na maior parte dos casos, está mesmo nos estatutos e que, no caso das sociedades cotadas em bolsa, se reveste de uma figura como a existente no Sporting: as acções de categoria A. Estas acções, uma espécie de “golden share” até agora detida em exclusivo pelo clube, concedem direito de veto em todas as alterações verdadeiramente significativas na governação da SAD. Mas a verdade é que, mesmo sem elas, é difícil ver quem queira meter dinheiro num negócio que até ver se tem revelado ruinoso, como é o futebol em Portugal. Porque, na verdade, o problema do futebol português não está em quem detém o capital, mas na limitação do mercado, que não proporciona receitas de televisão e marketing ao nível dos maiores. E isso não muda com investidores estrangeiros.
O fim do Farense
A SAD do Farense foi pioneira em Portugal no que à passagem do capital para mãos estrangeiras diz respeito, mas o comprador, o espanhol Juan Hidalgo, dono da agência de viagens Halcon, cedo desistiu da ideia, quando percebeu que, em Portugal, as SAD não tinham substituído os clubes, como em Espanha, e que o dinheiro que se aprestava para investir na criação da SAD seria canalizado para pagar dívidas do clube, de forma a poder inscrever a equipa na Liga, e não para apetrechar a equipa para concorrer com os melhores. Confrontados com esta realidade, os espanhóis começaram por desinvestir em tempo, entregando o negócio a administradores portugueses, mas acabaram mesmo por desistir. A SAD passou então para as mãos da Ambifaro, uma empresa municipal, mas isso também não a salvou da extinção, decretada seis anos depois da criação. O Farense passou então a competir apenas na formação mas já regressou, comandando a II Divisão distrital de Faro.
Inverfutbol após o Stellar Group no Beira Mar
O caso do último defeso em Portugal foi protagonizado pelo Beira Mar. Última classificada da Liga, a equipa de Aveiro meteu-se nas mãos de um investidor espanhol, Bartolomé Cursach, um empresário da área do lazer com sede em Maiorca. Este, por intermédio da sua empresa, a Inverfutbol, forçou o despedimento do treinador Carlos Carvalhal, que o clube contratara há cerca de um mês e, com o novo técnico, o inexperiente Paço Soler, fez chegar a Aveiro uma fornada de jogadores suficiente para fazer uma equipa totalmente nova.
Apesar de o Beira Mar não ter constituído uma SAD, esta é já a segunda parceria que o clube estabelece com investidores estrangeiros: na última vez que passou pela I Liga, o Beira Mar assinou com os britânicos Stellar Group um acordo em que estes traziam um treinador – veio Mick Wadsworth – e jogadores, em cujas transferências teriam depois uma participação de 50 por cento. Os resultados foram catastróficos, pois a equipa acabou por descer de divisão. Desta vez, embora o clube tenha uma menor participação nos casos de transferências futuras – recebe apenas 20 por cento pela valorização dos passes –, o reforço da equipa foi muito mais efectivo e o Beira Mar já está a colher frutos: ganhou três e perdeu apenas um dos cinco jogos feitos desde a chegada dos espanhóis.
Magnatas estrangeiros no futebol inglês
George Gillet e Tom Hicks
O primeiro fez fortuna na comunicação, na comida, nos resorts de esqui e já era dono dos Montreal Canadiens, uma equipa de hóquei no gelo. O segundo tornou a 7Up uma marca mundial, formou a Hicks & Muse e é dono dos Texas Rangers (basebol) e dos Dallas Stars (hóquei no gelo). Juntos compraram o Liverpool por cerca de 320 milhões de euros.
Malcolm Glazer
Começou por ser dono de parques de rulotes, mas depressa diversificou os seus investimentos a casas de repouso, aos media, ao petróleo e às franchises desportivas. Já era dono dos Tampa Bay Buccanneers quando comprou 98 por cento do Manchester United, por cerca de 1.100 milhões de euros. Muitos adeptos revoltaram-se e criaram o United FC, clube que joga nas divisões inferiores.
Roman Abramovich
De todos, é o mais rico: a Forbes estima que valha 15 mil milhões de euros e coloca-o como 11º mais rico do Mundo. A fortuna fê-la como governador da Chukotka, numa relação nunca explicada com Boris Yeltsin que lhe valeu a privatização da petrolífera russa Sibneft. A subida de Putin ao poder levou-o ao “exílio” em Londres, onde comprou o Chelsea por cerca de 200 milhões de euros.
Aleksandr Gaydamak
Filho de Arcadi Gaydamak, financeiro envolvido com Jean-Christophe Mitterrand no escândalo armas-por-petróleo com Angola, Aleksandr tem nacionalidade francesa e israelita e começou comprar metade do Portsmouth a Milan Mandaric. Seis meses depois, em Julho, adquiriu o resto das acções. No primeiro dia como dono, aprovou a aquisição de Manuel Fernandes ao Benfica (e a Zahavi).
Randy Lerner
Era dono dos Cleveland Browns, uma equipa de futebol americano, quando atingiu o controlo de 90 por cento das acções do Aston Villa, pagando a diversos accionistas cerca de 140 milhões de euros. Fez fortuna na análise financeira e, como já era adepto do clube desde que estudou em Camridge, em 1983, foi acolhido entusiasticamente pelos adeptos, que detestavam Doug Ellis, o anterior dono.
Eggert Magnusson
Dirigente reputado na Europa do futebol, lidera um consórcio islandês que bateu sobre a linha o polémico Kia Joorabchian na compra do West Ham, pelo qual pagou mais de 120 milhões de euros. Magnusson, que ficou rico no negócio do pão e das bolachas, fez parte do Comité Executivo da UEFA e, embora esteja para sair em breve, ainda é presidente da Federação Islandesa.
Regimes diferentes por toda a Europa
Os clubes ingleses são, até ver, os mais procurados pelos investidores estrangeiros, em parte porque em Inglaterra o regime legal favorece este tipo de operações – quem quiser comprar só tem que mostrar garantias de ter o dinheiro e passar num inquérito de “aptidão moral” dirigido pela Premier League. O factor mais relevante é, contudo, outro: é que o mercado inglês é aquele que mais dinheiro movimenta.
Contudo, os ingleses não estão sós. Em França, os dois clubes mais populares do país podem encontrar-se em breve em mãos estrangeiras. O Paris Saint Germain, que há quinze anos era detido pelo Canal Plus, foi comprado na Primavera passada pelo banco americano Morgan Stanley, pelo fundo de investimento francês Butler Capital Partners e pelo fundo de investimento americano Colony Capital, cada um controlando 33,3% do capital. Ao todo, custou 41 milhões de euros. E o Olympique de Marselha está em processo de venda a um canadiano, de seu nome Jack Kackhar, por 115 milhões de euros. O Lyon vai entrar em bolsa brevemente, mas Jean Michel Aulas guarda para o OL-Groupe 33 por cento do capital e tem nas mãos os 22 por cento da Pathé, o que lhe dá controlo de gestão.
Em Itália, em situação de insolvência geral, todos os clubes foram transformados em sociedades desportivas em 1967. Contudo, apesar de poder ser feita, não há uma tradição de compra dos maiores: Berlusconi é dono do Milan desde 1986; a FIAT toma conta da Juventus há três gerações; Massimo Moratti reassumiu no Inter o controlo que já tinha sido do pai, Ângelo, na década de 60. Em Espanha, por fim, nem todos os clubes passaram a sociedades – só os que estavam em situação financeira difícil foram obrigados a fazê-lo. Daí que, por exemplo, Real Madrid e Barcelona nunca tenham mudado de estatuto: são clubes e pertencem aos sócios.
Publicado em Correio da Manhã, 17/2/2007
Na base desta ideia do presidente do Sporting está a noção de que quem investe vai querer ter uma palavra a dizer na forma como o clube é gerido. Nada de estranho nem ameaçador, pois ninguém quererá meter milhões num clube de futebol para os perder com uma gestão ruinosa: se o faz é, de certeza, para ganhar. É essa a experiência que, após ondas de choque geradas no momento em que os maiores clubes ingleses começaram a ser adquiridos por multi-milionários estrangeiros, se vive neste momento em Inglaterra: o Manchester United caminha calmamente sob o domínio dos novos donos americanos, na frente do campeonato; os adeptos do Chelsea adoram Abramovich e o rol de títulos que ele trouxe para o clube com a sua lógica despesista e no Villa Park até já se entoam cânticos de apoio a Randy Lerner, o americano que comprou o clube ao velho Doug Ellis.
A questão é que – talvez com excepção de Roman Abramovich – todos os compradores de clubes ingleses entraram no negócio para ganhar dinheiro. E por isso escolheram um mercado que o proporciona, como o inglês. Oito dos 20 clubes mundiais que mais receita geraram no último ano jogam na Premier League. Na lista, elaborada pela Delloitte, aparece apenas um clube português, o Benfica, em 20º lugar. Um dado deprimente para os que entram numa Liga cujo melhor marcador, o camaronês Meyong, se transferiu do Belenenses para o modesto Levante, de Espanha, onde raramente é utilizado mas de onde ninguém consegue fazê-lo regressar, porque em Portugal os valores pagos são muito menores, ao nível da II Liga espanhola. A constatação desta realidade já levou dirigentes de SAD portuguesas, como o Belenenses, o Marítimo ou o Vitória de Setúbal, a admitir ceder o controlo maioritário a investidores que permitam concorrer com os clubes das Ligas que geram maiores receitas.
O risco da abertura do cofre a esses investidores, contudo, é maior do que parece – não por uma questão de perda de identidade ou de sujeição a uma qualquer OPA hostil, mas porque pode repetir-se o fenómeno-Farense (ver caixa). Claro que as coisas não têm necessariamente de correr mal, mas este é um fantasma com o qual os presidentes das SAD portuguesas terão de debater-se antes de verem os sócios aprovar a desblindagem do capital que, na maior parte dos casos, está mesmo nos estatutos e que, no caso das sociedades cotadas em bolsa, se reveste de uma figura como a existente no Sporting: as acções de categoria A. Estas acções, uma espécie de “golden share” até agora detida em exclusivo pelo clube, concedem direito de veto em todas as alterações verdadeiramente significativas na governação da SAD. Mas a verdade é que, mesmo sem elas, é difícil ver quem queira meter dinheiro num negócio que até ver se tem revelado ruinoso, como é o futebol em Portugal. Porque, na verdade, o problema do futebol português não está em quem detém o capital, mas na limitação do mercado, que não proporciona receitas de televisão e marketing ao nível dos maiores. E isso não muda com investidores estrangeiros.
O fim do Farense
A SAD do Farense foi pioneira em Portugal no que à passagem do capital para mãos estrangeiras diz respeito, mas o comprador, o espanhol Juan Hidalgo, dono da agência de viagens Halcon, cedo desistiu da ideia, quando percebeu que, em Portugal, as SAD não tinham substituído os clubes, como em Espanha, e que o dinheiro que se aprestava para investir na criação da SAD seria canalizado para pagar dívidas do clube, de forma a poder inscrever a equipa na Liga, e não para apetrechar a equipa para concorrer com os melhores. Confrontados com esta realidade, os espanhóis começaram por desinvestir em tempo, entregando o negócio a administradores portugueses, mas acabaram mesmo por desistir. A SAD passou então para as mãos da Ambifaro, uma empresa municipal, mas isso também não a salvou da extinção, decretada seis anos depois da criação. O Farense passou então a competir apenas na formação mas já regressou, comandando a II Divisão distrital de Faro.
Inverfutbol após o Stellar Group no Beira Mar
O caso do último defeso em Portugal foi protagonizado pelo Beira Mar. Última classificada da Liga, a equipa de Aveiro meteu-se nas mãos de um investidor espanhol, Bartolomé Cursach, um empresário da área do lazer com sede em Maiorca. Este, por intermédio da sua empresa, a Inverfutbol, forçou o despedimento do treinador Carlos Carvalhal, que o clube contratara há cerca de um mês e, com o novo técnico, o inexperiente Paço Soler, fez chegar a Aveiro uma fornada de jogadores suficiente para fazer uma equipa totalmente nova.
Apesar de o Beira Mar não ter constituído uma SAD, esta é já a segunda parceria que o clube estabelece com investidores estrangeiros: na última vez que passou pela I Liga, o Beira Mar assinou com os britânicos Stellar Group um acordo em que estes traziam um treinador – veio Mick Wadsworth – e jogadores, em cujas transferências teriam depois uma participação de 50 por cento. Os resultados foram catastróficos, pois a equipa acabou por descer de divisão. Desta vez, embora o clube tenha uma menor participação nos casos de transferências futuras – recebe apenas 20 por cento pela valorização dos passes –, o reforço da equipa foi muito mais efectivo e o Beira Mar já está a colher frutos: ganhou três e perdeu apenas um dos cinco jogos feitos desde a chegada dos espanhóis.
Magnatas estrangeiros no futebol inglês
George Gillet e Tom Hicks
O primeiro fez fortuna na comunicação, na comida, nos resorts de esqui e já era dono dos Montreal Canadiens, uma equipa de hóquei no gelo. O segundo tornou a 7Up uma marca mundial, formou a Hicks & Muse e é dono dos Texas Rangers (basebol) e dos Dallas Stars (hóquei no gelo). Juntos compraram o Liverpool por cerca de 320 milhões de euros.
Malcolm Glazer
Começou por ser dono de parques de rulotes, mas depressa diversificou os seus investimentos a casas de repouso, aos media, ao petróleo e às franchises desportivas. Já era dono dos Tampa Bay Buccanneers quando comprou 98 por cento do Manchester United, por cerca de 1.100 milhões de euros. Muitos adeptos revoltaram-se e criaram o United FC, clube que joga nas divisões inferiores.
Roman Abramovich
De todos, é o mais rico: a Forbes estima que valha 15 mil milhões de euros e coloca-o como 11º mais rico do Mundo. A fortuna fê-la como governador da Chukotka, numa relação nunca explicada com Boris Yeltsin que lhe valeu a privatização da petrolífera russa Sibneft. A subida de Putin ao poder levou-o ao “exílio” em Londres, onde comprou o Chelsea por cerca de 200 milhões de euros.
Aleksandr Gaydamak
Filho de Arcadi Gaydamak, financeiro envolvido com Jean-Christophe Mitterrand no escândalo armas-por-petróleo com Angola, Aleksandr tem nacionalidade francesa e israelita e começou comprar metade do Portsmouth a Milan Mandaric. Seis meses depois, em Julho, adquiriu o resto das acções. No primeiro dia como dono, aprovou a aquisição de Manuel Fernandes ao Benfica (e a Zahavi).
Randy Lerner
Era dono dos Cleveland Browns, uma equipa de futebol americano, quando atingiu o controlo de 90 por cento das acções do Aston Villa, pagando a diversos accionistas cerca de 140 milhões de euros. Fez fortuna na análise financeira e, como já era adepto do clube desde que estudou em Camridge, em 1983, foi acolhido entusiasticamente pelos adeptos, que detestavam Doug Ellis, o anterior dono.
Eggert Magnusson
Dirigente reputado na Europa do futebol, lidera um consórcio islandês que bateu sobre a linha o polémico Kia Joorabchian na compra do West Ham, pelo qual pagou mais de 120 milhões de euros. Magnusson, que ficou rico no negócio do pão e das bolachas, fez parte do Comité Executivo da UEFA e, embora esteja para sair em breve, ainda é presidente da Federação Islandesa.
Regimes diferentes por toda a Europa
Os clubes ingleses são, até ver, os mais procurados pelos investidores estrangeiros, em parte porque em Inglaterra o regime legal favorece este tipo de operações – quem quiser comprar só tem que mostrar garantias de ter o dinheiro e passar num inquérito de “aptidão moral” dirigido pela Premier League. O factor mais relevante é, contudo, outro: é que o mercado inglês é aquele que mais dinheiro movimenta.
Contudo, os ingleses não estão sós. Em França, os dois clubes mais populares do país podem encontrar-se em breve em mãos estrangeiras. O Paris Saint Germain, que há quinze anos era detido pelo Canal Plus, foi comprado na Primavera passada pelo banco americano Morgan Stanley, pelo fundo de investimento francês Butler Capital Partners e pelo fundo de investimento americano Colony Capital, cada um controlando 33,3% do capital. Ao todo, custou 41 milhões de euros. E o Olympique de Marselha está em processo de venda a um canadiano, de seu nome Jack Kackhar, por 115 milhões de euros. O Lyon vai entrar em bolsa brevemente, mas Jean Michel Aulas guarda para o OL-Groupe 33 por cento do capital e tem nas mãos os 22 por cento da Pathé, o que lhe dá controlo de gestão.
Em Itália, em situação de insolvência geral, todos os clubes foram transformados em sociedades desportivas em 1967. Contudo, apesar de poder ser feita, não há uma tradição de compra dos maiores: Berlusconi é dono do Milan desde 1986; a FIAT toma conta da Juventus há três gerações; Massimo Moratti reassumiu no Inter o controlo que já tinha sido do pai, Ângelo, na década de 60. Em Espanha, por fim, nem todos os clubes passaram a sociedades – só os que estavam em situação financeira difícil foram obrigados a fazê-lo. Daí que, por exemplo, Real Madrid e Barcelona nunca tenham mudado de estatuto: são clubes e pertencem aos sócios.
Publicado em Correio da Manhã, 17/2/2007
O problema e a solução
Os teorizadores do bom futebol não se cansam de nos dizer que quem joga bem dá um passo em direcção à vitória e de negar a eficácia do cinismo na obtenção de resultados. Concordo, na medida em que não acredito numa relação causal entre o mau futebol e as vitórias. Mas as coisas não são assim tão lineares – há sempre lugar a um período de adaptação quando se quer passar de uma realidade para a outra. Isto é, pode ser-se bom a jogar mau futebol, como pode ser-se mau a jogar bom futebol. E vice-versa. O Benfica, por exemplo, foi campeão a jogar mau futebol, porque o fazia com inteligência e eficácia. Agora, quis voltar a um futebol vistoso, mas está a sentir dificuldades, bem reflectidas nos últimos jogos.
O segredo do Benfica de Trapattoni era a rapidez nas transições. O Benfica proclamava o seu miserabilismo como forma de convencer os adversários de que podiam ganhar-lhe, convidava-os a atacar e, num ápice, não só recuperava a bola como a colocava rapidamente na frente e fazia golos. Escudado na sua velocidade, na capacidade de definição e na inteligência como futebolista, Simão era a figura maior desse onze. Ora, não só por ter ganho assim o campeonato que pôs fim ao mais longo jejum de títulos na história do clube, mas também por força do hábito, a equipa acomodou-se a esse futebol de que os adeptos nunca gostaram – razão pela qual Trapattoni não viu o contrato renovado e lhe sucedeu Ronald Koeman.
Koeman, contudo, acabou por ceder aos pedidos mudos feitos pelo ADN dos seus jogadores e o processo não evoluiu como os adeptos quereriam. Contudo, os tempos, agora, são diferentes. O Benfica recuperou Rui Costa, o último grande jogador formado na Luz, e quer encher o estádio à custa de um futebol faustosamente ofensivo. Onde antes proclamava miserabilismo, o clube quer agora ostentar um poder compatível com o estatuto adquirido através da presença no lote dos 20 mais ricos do Mundo. Contra o Boavista, fez uma das melhores exibições dos últimos tempos, mas não ganhou; na Póvoa, fez uma primeira parte razoável, mas acabou eliminado da Taça pelo Varzim, do escalão secundário; face ao Dínamo, atacou incessantemente mas só conseguiu o golo salvador a um minuto do fim. A questão é que, ao trocar o ataque rápido e o contra-ataque pelo ataque organizado, o Benfica está a apelar a atributos diferentes dos que lhe vinham garantindo o sucesso. Por uma razão muito simples – o tempo que se leva a chegar à baliza em ataque organizado também permite ao adversário estar… organizado na defesa.
E há “nuances”. Na Póvoa, enquanto o Benfica ocupou os espaços do meio-campo sem contar com Rui Costa (com Beto, Katsouranis e Coimbra) e teve à frente dele duas referências capazes de prender um defesa-central e o médio defensivo (Nuno Gomes e Simão), o “maestro” soltou-se bem e fez dois ou três passes de golo. Na segunda parte, quando a equipa precisou que ele recuasse para ocupar um dos lugares no meio-campo (o que nunca fez convenientemente) e lhe tirou as referências para os bloqueios frontais, passando a jogar num 4x3x3 que favorece o encaixe dos três atacantes nos quatro defesas adversários, ele desapareceu. O “Maestro” é ao mesmo tempo, a origem e a solução para o problema. Mas é preciso saber utilizá-lo.
DÚVIDAS LEGÍTIMAS
O 3x4x1x2 é boa alternativa para o Sporting?
É. Porque o Sporting tem três bons centrais, dois dos quais com prática de fecharem as laterais. Porque lhe permite uma melhor ocupação dos corredores no ataque sem perder gente ao meio, pois mantém três homens focados no jogo interior. Terá fragilidades na transição defensiva, nas alas, mas nem toda a gente conseguirá explorá-las.
Cristiano Ronaldo deve ir para Espanha?
Do ponto de vista futebolístico, não: nenhuma equipa pode proporcionar-lhe a evolução tranquila que tem pela frente no Manchester United, um grande europeu onde tem margem de progressão e é protegido. Mas o futebol é um negócio e, para haver negócio, tem que haver lucro e o capital precisa de estar sempre a mexer.
É normal um treinador substituir um suplente?
Depende da relação com o plantel. O que Rednic fez a Kalanga – substituiu-o pouco depois de o fazer entrar – pode matar um jogador ou, em alternativa, se o grupo sentir a injustiça, acabar com o técnico. Mas Rednic parece um líder férreo e incontestado. E o futebol contemplativo de Kalanga estava a pedi-las.
PÉ DE PÁGINA
ABRAÇO. O abraço de Ronaldinho a Eto’o fica bem nos jornais e passa ainda melhor nos blocos noticiosos das televisões, mas não esconde o verdadeiro problema. E o problema é muito simples: agora que passou o Mundial, que o Barça até ganhou uma Liga dos Campeões com a sua própria versão dos galácticos, vieram à tona as personalidades fortes e a disparidade de interesses num balneário difícil de gerir.
EGOS. Claro que acima de tudo estão os egos gigantescos de jogadores que foram habituados a serem idolatrados desde tenra idade. Ronaldinho não admite que lhe apontem nada, apesar de estar a milhas do seu rendimento do ano passado. Eto’o, que toda a gente sabe que não é flor que se cheire, não quer ser bode expiatório da crise de resultados e entrar em campo para os últimos cinco minutos de um jogo, porque acha que vale mais que isso.
FIM DE CICLO. Tudo prenuncia um fim de ciclo estrondoso lá para o Verão. Rijkaard assobia para o ar, porque sabe bem que só tem de aturar estas birras até Maio – depois se encarregará do Milan ou do Chelsea, onde entrará com o contador a zeros. E a grande dúvida é se, antes de sair, ainda ganha alguma coisa, se este será mesmo o ano do Sevilha ou se, de fininho, sem se dar por ele, Capello ainda fica a rir-se.
Publicado em Record Dez, 17/2/2007
O segredo do Benfica de Trapattoni era a rapidez nas transições. O Benfica proclamava o seu miserabilismo como forma de convencer os adversários de que podiam ganhar-lhe, convidava-os a atacar e, num ápice, não só recuperava a bola como a colocava rapidamente na frente e fazia golos. Escudado na sua velocidade, na capacidade de definição e na inteligência como futebolista, Simão era a figura maior desse onze. Ora, não só por ter ganho assim o campeonato que pôs fim ao mais longo jejum de títulos na história do clube, mas também por força do hábito, a equipa acomodou-se a esse futebol de que os adeptos nunca gostaram – razão pela qual Trapattoni não viu o contrato renovado e lhe sucedeu Ronald Koeman.
Koeman, contudo, acabou por ceder aos pedidos mudos feitos pelo ADN dos seus jogadores e o processo não evoluiu como os adeptos quereriam. Contudo, os tempos, agora, são diferentes. O Benfica recuperou Rui Costa, o último grande jogador formado na Luz, e quer encher o estádio à custa de um futebol faustosamente ofensivo. Onde antes proclamava miserabilismo, o clube quer agora ostentar um poder compatível com o estatuto adquirido através da presença no lote dos 20 mais ricos do Mundo. Contra o Boavista, fez uma das melhores exibições dos últimos tempos, mas não ganhou; na Póvoa, fez uma primeira parte razoável, mas acabou eliminado da Taça pelo Varzim, do escalão secundário; face ao Dínamo, atacou incessantemente mas só conseguiu o golo salvador a um minuto do fim. A questão é que, ao trocar o ataque rápido e o contra-ataque pelo ataque organizado, o Benfica está a apelar a atributos diferentes dos que lhe vinham garantindo o sucesso. Por uma razão muito simples – o tempo que se leva a chegar à baliza em ataque organizado também permite ao adversário estar… organizado na defesa.
E há “nuances”. Na Póvoa, enquanto o Benfica ocupou os espaços do meio-campo sem contar com Rui Costa (com Beto, Katsouranis e Coimbra) e teve à frente dele duas referências capazes de prender um defesa-central e o médio defensivo (Nuno Gomes e Simão), o “maestro” soltou-se bem e fez dois ou três passes de golo. Na segunda parte, quando a equipa precisou que ele recuasse para ocupar um dos lugares no meio-campo (o que nunca fez convenientemente) e lhe tirou as referências para os bloqueios frontais, passando a jogar num 4x3x3 que favorece o encaixe dos três atacantes nos quatro defesas adversários, ele desapareceu. O “Maestro” é ao mesmo tempo, a origem e a solução para o problema. Mas é preciso saber utilizá-lo.
DÚVIDAS LEGÍTIMAS
O 3x4x1x2 é boa alternativa para o Sporting?
É. Porque o Sporting tem três bons centrais, dois dos quais com prática de fecharem as laterais. Porque lhe permite uma melhor ocupação dos corredores no ataque sem perder gente ao meio, pois mantém três homens focados no jogo interior. Terá fragilidades na transição defensiva, nas alas, mas nem toda a gente conseguirá explorá-las.
Cristiano Ronaldo deve ir para Espanha?
Do ponto de vista futebolístico, não: nenhuma equipa pode proporcionar-lhe a evolução tranquila que tem pela frente no Manchester United, um grande europeu onde tem margem de progressão e é protegido. Mas o futebol é um negócio e, para haver negócio, tem que haver lucro e o capital precisa de estar sempre a mexer.
É normal um treinador substituir um suplente?
Depende da relação com o plantel. O que Rednic fez a Kalanga – substituiu-o pouco depois de o fazer entrar – pode matar um jogador ou, em alternativa, se o grupo sentir a injustiça, acabar com o técnico. Mas Rednic parece um líder férreo e incontestado. E o futebol contemplativo de Kalanga estava a pedi-las.
PÉ DE PÁGINA
ABRAÇO. O abraço de Ronaldinho a Eto’o fica bem nos jornais e passa ainda melhor nos blocos noticiosos das televisões, mas não esconde o verdadeiro problema. E o problema é muito simples: agora que passou o Mundial, que o Barça até ganhou uma Liga dos Campeões com a sua própria versão dos galácticos, vieram à tona as personalidades fortes e a disparidade de interesses num balneário difícil de gerir.
EGOS. Claro que acima de tudo estão os egos gigantescos de jogadores que foram habituados a serem idolatrados desde tenra idade. Ronaldinho não admite que lhe apontem nada, apesar de estar a milhas do seu rendimento do ano passado. Eto’o, que toda a gente sabe que não é flor que se cheire, não quer ser bode expiatório da crise de resultados e entrar em campo para os últimos cinco minutos de um jogo, porque acha que vale mais que isso.
FIM DE CICLO. Tudo prenuncia um fim de ciclo estrondoso lá para o Verão. Rijkaard assobia para o ar, porque sabe bem que só tem de aturar estas birras até Maio – depois se encarregará do Milan ou do Chelsea, onde entrará com o contador a zeros. E a grande dúvida é se, antes de sair, ainda ganha alguma coisa, se este será mesmo o ano do Sevilha ou se, de fininho, sem se dar por ele, Capello ainda fica a rir-se.
Publicado em Record Dez, 17/2/2007
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