Sergio Campana, presidente da Associação Italiana de Futebolistas, fez há uma semana e meia uma carta aberta a todos os adeptos do futebol, explicando que, em caso de haver um jogador por terra, deve ser o árbitro – por oposição aos colegas ou adversários – a decidir se o jogo deve ou não ser interrompido. Porquê? É o próprio Campana quem explica: “é para evitar tudo o que acontece neste momento nos estádios. Oportunismo, polémica, discussões…”
O presidente do sindicato dos jogadores italianos veio dar voz, de forma mais polida é certo, ao que Jorge Jesus já reclama há meses de um modo bastante mais prosaico. Quando diz que “isso do ‘fair-play’ é uma treta”, Jesus seguramente sabe do que fala, até porque anda nos relvados há mais de 30 anos. E se o diz é porque tem menos vergonha do que a generalidade dos seus colegas de ofício. Pelo menos metade das interrupções a que é sujeito hoje em dia um jogo de campeonato devem-se a lesões fictícias. Seja porque se marcou recentemente o golo da vantagem e é preciso travar o ímpeto ao adversário, porque é apenas necessário queimar tempo ou descansar na parte final da partida ou ainda porque são necessárias instruções vindas do banco, há jogadores que sabem bem quando e como devem cair para motivar a entrada em campo do carro-maca. E atenção que por cá ainda não se chegou ao limite já visto noutros locais, que é um jogador magoar-se “seriamente” no momento em que a equipa adversária parte para um contra-ataque perigoso.
Com isto, começa por perder o espectáculo e, por inerência, quem paga para o ver. Depois, perde a verdade desportiva, porque além de representar tudo menos “fair-play”, este expediente é capaz de transformar rapidamente uma situação a meio-campo num lançamento lateral perto da área do adversário, onde uma recuperação de bola pode ser ouro. Seja para evitar cair nestas armadilhas ou para promover o verdadeiro “fair-play” – que deve ser sentido e nunca confundido com um acto maquinal de deitar a bola para fora quando alguém cai para o chão ou devolvê-la ao adversário de forma a ganhar terreno – é preciso mexer na situação presente, sob o risco de se chegar a extremos já vistos na sociedade.
Lisboa ainda não é Los Angeles, mas há uns meses, numa das principais artérias da cidade, passei de carro e vi um homem tombado no chão, aparentemente inanimado. Quando, meia hora e milhares de transeuntes depois, passei em sentido inverso, ele ainda lá estava. Liguei para o 112 e fiquei a pensar no que teremos feito para causar tamanha indiferença. Provavelmente já todos ouvimos falar em cidadãos que se arrependeram de ter auxiliado quem tombara apenas para os assaltar. Não podemos ter ambulâncias de patrulha nas ruas, mas num campo de futebol há quatro árbitros para julgar se alguém precisa de ajuda. E se forem poucos, podemos sempre aproveitar a boleia de Platini e juntar-lhe mais.
Publicado em Sábado, 31/1/2007
sexta-feira, 23 de fevereiro de 2007
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