sexta-feira, 23 de fevereiro de 2007

Mercado de ocasião

Os candidatos ao título não têm estado muito activos neste mercado de Inverno. E, se calhar, não fazem mal, a julgar pelo aproveitamento que têm tirado das aquisições feitas em desespero de causa, a meio das últimas épocas. Dos 20 jogadores contratados nesta fase dos dois últimos campeonatos por FC Porto, Sporting e Benfica, só quatro se mantém hoje fiéis às expectativas que originaram no momento da chegada. Ao contrário, doze nem “sobreviveram” ao final da época em que apareceram.
Quando o dinheiro para gastar – seja em ordenados, em custos de transferência ou até em tarefas de prospecção – não é muito, é normal que os jogadores que chegam neste mercado de ocasião, destinados a suprir à pressa lacunas indetectadas no início das épocas ou entretanto criadas, não sejam exactamente aquilo de que os treinadores precisavam. Como é normal também que, devido à pressão que neles é colocada, muitos – especialmente os que vêm de fora – acabem por falhar e regressar à base uns meses depois. Por alguma razão três dos quatro jogadores que ainda hoje são frequentemente titulares – bem como dois dos quatro que, não jogando sempre, continuaram nos plantéis a seguir às férias de Verão – tinham um passado no futebol português. E isso, seja porque o jogador se adapta melhor, seja porque as suas características são mais conhecidas pelo recrutador, faz toda a diferença.
Se em relação a Nuno Assis, que já tinha 153 jogos na I Liga quando chegou ao Benfica, a Abel (123 jogos) ou Caneira (apenas 58, mas uma carreira na selecção nacional) o risco era pouco mais do que nulo, mesmo no caso de Anderson, o único sucesso de mercado de Inverno contratado sem ter história em Portugal, esse factor foi reduzido ao mínimo. É que o jovem prodígio vindo do Grémio teve a seu favor dois factores que não são negligenciáveis: o seu inquestionável valor é do conhecimento público, o que de si já reduzia a possibilidade de haver enganos de monta, e passou por um período de adaptação resguardado das luzes da ribalta, na equipa B, só fazendo dois jogos como titular na primeira meia-época.
Um pouco mais de resguardo era o que teria necessitado Moretto, melhor guarda-redes da Liga na primeira metade da época passada, no V. Setúbal, e de imediato feito titular por Koeman no Benfica, o que lançou contra ele a pressão adicional de ter roubado o lugar a um dos guarda-redes da selecção. Por isso ou porque não tem escola de equipa grande – há guarda-redes que precisam de estar sempre em actividade para manter a concentração e a qualidade –, a verdade é que Moretto foi vendo acumular-se a contestação até voltar a ceder a titularidade a Quim. E está hoje para o Benfica como Romagnoli para o Sporting ou Ibson para o FC Porto: vê-se que há ali potencial mas não se percebe bem como pode ele ser explorado e admite-se que tenha de trilhar outro caminho para ser feliz.
Se Adriano ainda foi importante na conquista do título pelo FC Porto depois de regressar a Portugal e esta época apenas foi prejudicado por uma lesão e por um Postiga transformado em goleador total, o mesmo já não pode dizer-se dos doze jogadores que, nos últimos dois anos, não justificaram sequer a continuidade nos plantéis assim que o mercado voltou a abrir. A grande maioria eram atacantes, a provar que o golo leva ao desespero quem o procura com ansiedade. E que, em tempos de desespero, nem sempre as respostas são as melhores. Às vezes, vale mais nem mexer.

APROVEITAMENTO REDUZIDO
Aprovados
Anderson (FC Porto, 2006)
Caneira (Sporting, 2006)
Abel (Sporting, 2006)
Nuno Assis (Benfica, 2005)

Vão à oral
Adriano (Porto, 2006)
Moretto (Benfica, 2006)
Romagnoli (Sporting, 2006)
Ibson (Porto, 2006)

Reprovados
Manduca (Benfica, 2006)
Robert (Benfica, 2006)
M. Ferreira (Benfica, 2006)
Marcel (Benfica, 2006)
Koke (Sporting, 2006)
André Luís (Benfica, 2005)
Delibasic (Benfica, 2005)
Leo Lima (Porto, 2005)
Leandro (Porto, 2005)
C. Pittbull (Porto, 2005)
Leandro Bomfim (Porto, 2005)
Mota (Sporting, 2005)


DÚVIDAS LEGÍTIMAS
As sobras dos ricos deixaram de ser hipótese?
Não, mas desde o acórdão-Bosman o custo de uma equipa ficou tão mais alto e as diferenças entre ricos e pobres tão maiores que os nossos clubes têm dificuldades em pagar salários de jogadores que jogam pouco em equipas de segunda ou terceira linha do primeiro mercado. E estes também não querem continuar a pagá-los.

O melhor é recorrer ao mercado nacional?
Para se conseguir impacto súbito, sim. Não pode esperar-se que um jogador vindo do Leste da Europa, de África ou da América Latina chegue a uma realidade totalmente nova e comece imediatamente a render. O recurso a mercados alternativos deve ser visto como arma para o médio e longo prazo, quando se pode resguardar o jogador.

Do que precisam os candidatos ao título?
Primeiro, têm de se livrar dos excedentários. Depois, no FC Porto falta um lateral e um extremo capaz de desviar as atenções de Quaresma. No Benfica, tudo depende do que mostrar Rui Costa, mas falta sempre um goleador. E no Sporting falta um parceiro para Liedson e um 10 que permita a Moutinho recuar para organizar a equipa.

Publicado em Record Dez, 6/1/2007

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